domingo, 23 de dezembro de 2012

Recesso.

Escreve e para. Escreve e para. Não, chega. O cérebro entrou de férias. Recesso até o ano que vem, exceto aconteça alguma transformação radical que ative a minha subjetividade. Por enquanto, o corpo esparrama no sofá e tenta até resgatar do fundo de algum lugar alguma emoção natalina ou de fim de ano, coisa de fazer retrospectiva e dizer "confesso que vivi, que amei, que chorei, que sorri". Recados para aqueles que cruzaram nossas vidas e tudo mais, mas nada vem. Só há um corpo esparramado no sofá comendo uvas e esperando o ano acabar logo.

Minha subjetividade é assim: tem ritmo próprio. E aí que ousem dizer que é tempo de falar coisas bonitas que ela entra em greve. Ou: recesso. Quem sabe em 2013 eu escreva algo de 2012. Quem sabe...

sábado, 22 de dezembro de 2012

Revirando cartas e sentimentos antigos.


 Cuando estamos juntos
somos sustantivos puros:
fuego, rama,
túneles, líquido, morada,
intercambio de sangre y de ternura,
de resurgimientos y pobrezas,
devoradores de mundos,
hacedores de universos,
fugitivos de este profundo
desentendimiento.
Adriana Kaufmann ("De Vampirismo y otras ternuras")

devoradores de mundo, fugitivos deste profundo desentendimento. ah, como isso é bom.
nós dois, a vida. hoje é tudo maravilhoso, e por tua causa - é o que digo, enquanto a "ressaca de realidade" não bate, hehe.
hoje eu te quero pra vida inteira. hoje a vida é inteira, e eu te quero.

2009.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Associação Livre / Fragmentos


Suco. Riso. Silêncio. Igreja. Chuva. Canudos. Os mesmos canudos. Queijo. Laconismo. Perto e Distante.  Metrô. Arte. Cafonice. Porto Alegre. Planos. Beijo molhado. Divino. Promessa. Aposta. Tensão. Tesão. Carinho. Ombro. Posso dar uma palavrinha? Não, obrigada. Camiseta. Conversa. Você não gosta de baralho? Cheiro. Lingua. Não morde. Tatuagem. Pés. Olhar. Suor. Cabou. Dois estranhos. Voltou. Mais. Chega. Trovão. Grito. Sussurro. You really got a hold on me...
Freia. Freia. Freia !!!

Recolhe as roupas, de volta ao mundo real. Ainda de pernas bambas, um tanto perdida na grande e louca cidade de São Paulo, segue sem compromisso, um pouco sem rumo, sem chão.

Seremos dois novos amantes
Pelo amor energizados
Transformados,
Mas em que??
Quem eras antes de mim??
Quem sou depois de você??

Pedro Bandeira


Ainda cedo pra dizer.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Rapidinhas


rapidinha 1: na casa dos meus pais tem um aspirador de pó com quase o dobro da minha idade. as coisas modernas não duram nem cinco anos.

rapidinha 2: e se não é você, é a gripe que me bota de cama.vem com força para lembrar que sou frágil e que estou sozinha. estar doente e não ter quem te cuide, tristeza maior não há. os olhos cansados, corpo que pede por uma trégua. com o tempo se aprende a dosar a vida. ou não.

rapidinha 3: duas mulheres conversando sobre o novo romance de uma delas. uma pergunta: e ele também trabalha horário comercial? segunda a sexta, até às 17h? e a outra respondeu: sim! é ótimo, não? amar no capitalismo é assim, a gente se prende a umas perguntas tão estranhas quando o outro nos confessa amar. e a gente se alegra com coisas tão esquisitas.

rapidinha 4: bacon e cigarro e café liberado. o que não pode é mais de uma paixão por vez. aí meu coraçãozinho não aguenta. platônica ou não, é preciso uma por vez.

rapidinha 5: sintoma de carência é reviver amores antigos relendo cartas antigas.

"na verdade, não levo jeito pra essas coisas, essas coisas de se relacionar. sei lidar bem com começos - já tive muitos.
mas me perco meses depois. acho que você é agora a pessoa com quem fiquei mais tempo, tirando o namoro eterno de cinco anos.
isso é legal, mas é tipo video game - daquela época antiga, sem memory card. a gente vai jogando, e nessas fases difíceis dá medo de dar game over. e são fases novas, que poucos amigos chegaram. existe uma expectativa, dos arredores, pra que a gente dá certo.
e se quer saber, te digo que a gente dá (certo). porque tem alegria, tristeza, orgasmo, ódio, ciúme, risada, gargalhada, discussões, paixão... e tudo vem cheio de amor. com cobertura extra.
"

ficar curiosa sobre os relacionamentos alheios, querendo saber como estão.
assistir a casais que trocam afetos no metrô, sorrindo sozinha e desejando "eu quero isso também".
rapidinha 6: na minha família o natal é dia 19 de dezembro e a gente come pizza e bolo. tem presente, mas não tem chester e hipocrisia. é bom assim.

rapidinha 7: na tv globo

- qual foi o grande amor da sua vida?
- não tive. - a velha abaixa a cabeça e sorri, encurralada entre o repórter, a câmera focada nela e o microfone em seu rosto. sorri, talvez por vergonha, talvez só por rir mesmo.
meu coração ficou apertado. que coisa mais triste!

rapidinha 8: da série cantadas internacionalistas.
- i´m leaving now, kiss you anywhere you want.
- so kiss me in Brazil!

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Dois ou três almoços, uns silêncios.

..."Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

(...)

Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.
Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome."...


Caio Fernando de Abreu.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

"A vida é mais perigosa que a morte." *

ontem
um estudante se matou.
um amigo surtou.
um cachorro morreu.

nenhum canal na tv anunciará isso. não estará em nenhuma manchete de jornal algum. afinal, é só mais um suicídio, só mais um surto, só mais uma morte por velhice - e de um cachorro, ainda por cima. isso acontece o tempo todo e nós já estamos acostumados, não é mesmo?
o procedimento é o mesmo: algumas lágrimas derramadas, poucas reflexões, entra para a estatística e é isso. não há muito o que fazer.

em compensação, há algo de diferente nessa chuva. de um jeito estranho, sinto o mundo como meu companheiro, que chora comigo as dores da vida. eu choro com o mundo, pois sei que tem suas dores próprias pra sentir também. ficamos chorando, eu e o mundo. às vezes não tem muito o que fazer que não seja deixar sentir a dor, deixar chover, deixar se molhar.

e de noite fechamos o olho. tudo fica escuro e o silêncio começa a tomar conta, fazendo crescer um desejo por dias mais ensolarados.

* frase da Kinna.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Do feminismo nosso de todo dia.

"Maquilagem, cabelo, roupa, corpo e homens! Saiba tudo o que uma mulher precisa aqui! Responda SIM e assine por R$0,35/dia os segredos que toda mulher tem que saber"

Recebi essa mensagem no celular essa semana, e ficou ecoando na minha cabeça o tempo todo. Em um primeiro momento, o fato de "maquilagem, cabelo, roupa e corpo" serem colocados no mesmo "conjunto" de "homem". Como se tratasse de um mesmo grau de interesse e de uma mesma necessidade de atenção a forma como escolhemos um penteado ou nos relacionamos com outro ser humano. A questão é essa: não se trata de relações humanas. É uma coisa, os homens. Precisamos saber o que eles afinal pensam e querem, e como fazer para ganhá-los. Dos bons, evidentemente. E claro, a melhor opção é adquirindo um serviço de celular.

Propaganda no Yahoo - Oferta do dia: "solteiro"
Sempre escrevo insistentemente sobre como reproduzimos nas relações humanas a forma que nos relacionamos com as coisas. Insisto porque é uma lógica que estamos todos sujeitos a reproduzir sem perceber. E é muito triste esse grau de previsibilidade e clichê que nos tornamos. Repetimos e repetimos insistentemente, tentando reproduzir da forma mais correta que a "receita" prescreve a forma de amar outra pessoa, as outras pessoas. Mesmo que esse modelo nos custe colocar de lado nossos desejos e vontades.  Não bastasse nos ordenar: trabalhas, pague, compre... também nos orientam: ame aquele, seja desse jeito, sirva a teu esposo dessa forma, reproduza filhos sadios.

Para além dessa relação reificada, existe essa redução do que se trata ser mulher. É tão cristalizado e naturalizado que penso quantas mulheres questionaram ao receber um SMS. Eu me senti, ao ler, extremamente reduzida. Como se fosse isso que a mulher deveria se interessar: estética e homens. Estética para conseguir atrair os homens. Parece bobeira, parece papo chato de feminista como gostam de falar por aí mas não é! Normalmente fico brava e me irrito com essas mensagens - não só do celular, mas cenas da televisão que nos reduzem dessa forma: Seja burra, mas seja gostosa. Seja decidida, porque os homens gostam, mas não tão decidida, porque eles assustam. Seja sexy, mas não seja vulgar - pode dificultar arrumar um marido - coisa mais fácil é ser mal falada.

Dessa vez não fiquei brava, mas fiquei triste. A cena que me veio na cabeça era como uma criança gordinha com roupinha de ginástica, tentando impressionar os pais com coreografias mirabolantes e mal sucedidas, que dão risada tentando dizer: "não precisa disso, queridinha". De repente eu era essa criança, em meio a tantos livros, buscando com tanto compromisso uma formação humana com o objetivo de contribuir da melhor forma pra uma transformação social... e a sociedade me manda um SMS dizendo que tudo que eu preciso é de uma boa sombra e um bom decote. Desista. Esse mundo dos pensantes não é pra ti, lindinha.

Talvez um homem não tenha a dimensão disso, do que significa ouvir quase a vida toda que sua inteligência é bônus. Ou, pior, como algo que atrapalha. Melhor que seja burra mesmo, mas bonita. Bem cuidada. Belos dentes. Contanto que o conjunto de roupas e maquilagem estejam de acordo, tanto faz o que falaremos. Lembro de um livro, sobre Simone de Beauvoir e Sartre no Brasil, que comentava de notícias do jornal, que quase não falavam dela, apontando os holofotes sempre para Sartre. Muitas vezes, ela era isso: a companheira de Sartre. O cúmulo do absurdo foi em uma palestra dela os jornalistas comentarem sobre a ausência de Sartre na platéia, pois estava sabe lá onde. A ausência de Sartre era mais interessante que Simone falando.

Nós nos acostumamos (essa palavra dói nos ossos na alma e em tudo) a essa condição. Reduzidas a uma máquina de fazer filhos e refeições para o marido. Com uma calça que ressalta a bunda e um sutiã que valoriza os seios, uma maquilagem que esconde as olheiras de cansaço e qualquer sinal de idade - afinal, temos que nos manter ou aparentar jovens, para não sermos trocadas.

Parece exagero, mas se pararmos para pensar é essa imagem que está de fundo quando nos dão bonecas de presente, quando nos mostram desde pequenas o batonzinho, a bolsinha, o sapato alto. Fogãozinho. Nos ensinam a sentar de perna fechada - "senta igual mocinha". Se buscarmos entender o que está no nosso imaginário social, o que está pelas televisões, nas notícias de jornal, nas músicas... é isso que está nos dizendo. O tempo todo. E se entendemos a mensagem e questionamos somos as feministas chatas. Não entendemos a brincadeira.

Pois é, eu não entendi a brincadeira, sociedade. Talvez eu tenha perdido a parte engraçada quando um sujeito imaginou que tinha permissão de agarrar a minha bunda no metrô quando eu não tinha nem 18 anos - eu fiquei com vergonha, ao invés de ficar brava. Ele disse que foi sem querer, mas eu e ele - e o resto que viu - sabe que não foi. Talvez era muito nova pra entender a piada quando o zelador do prédio ao lado me chamou de gostosa ao me ver com o uniforme da escola, e eu então fiquei um tempo sem coragem de usar saia. Talvez não tenha entendido a piada quando um "companheiro" me disse que eu não precisava falar muito para convencer os homens a ser militante, basta piscar meus olhinhos verdes. Ou perdeu a graça - tantas brincadeiras depois -  quando eu vi na TV que mulher feia deve agradecer ser estuprada. Não vi graça mesmo ao sentir medo de voltar pra casa pois morava num prédio que outras garotas tinham sido estupradas outras vezes, algo "recorrente naquela região". Esqueci de rir quando bateram na minha vizinha, pelo fato dela ser mulher, e de seu esposo estar com raiva - que outro lugar para depositar sua raiva, que não em sua mulher, não é mesmo?

A forma de apagar essa mensagem da cabeça é talvez escrever sobre. Denunciar. É o que podemos fazer. Sabemos que nosso grito não tem o alcance das palavras e gestos sufocantes do outro lado, mas vamos tentando. Que chegue em uma, que alcance outra, que questione mais uma. Quem sabe alguns companheiros no caminho se sensibilizem. Até que um dia deixem de nos querer deixar pequenas. Até que nós passemos a aprender que não devemos pedir permissão para sermos grandes do jeito que somos. Até que um dia a opressão comece a perder a graça, e possa, quem sabe, ser superada.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

344 de muitas.

O Gmail denuncia nosso romance: revejo nossa história e relembro passos, caminhos, conversas, segredos, sussurros, mentiras, filmes. Quanta música! Quanta alegria e dor. Em alguns momentos, éramos Leo Jogiches e Rosa Luxemburgo, trocando cartas sobre diagramação de panfletos e textos e no meio disso alguns gracejos de amor.

Éramos ingênuos e criminosos. Éramos turistas nesse mundo civilizado, onde as pessoas comem com as mãos e falam baixo. Nós gritávamos, sufocados pelo calor daquela cidade e daquela casa sem ventilador.
Nosso romance torto me rendeu a capacidade de escrever - coisa que confesso aqui, e que sequer pra mim havia confessado antes. Foi você, foi o que você me fez falar que me ensinou a escrever. você que me ensinou como gostar - o pior professor que poderia ter, já que ambos podemos ser considerados fracassados nessa arte diante de nossos relacionamentos mal sucedidos que seguiram o nosso pequeno grande desastre.

Hoje você não é nada - nem saudade, nem presente, nem futuro e às vezes nem passado. Penso muito pouco em você. E por incrível que pareça não há rancor, ou tristeza, mágoa. Não existe nada e isso não me deixa nem triste. E aí no meio de uma tarde de tédio fui surpreendida por isso: "344 de muitas". Foi como assistir a um filme que conhecia uma das personagens principais. Me reconheci em muitos momentos, outros nem tanto.

Foi você que me colocou pra escrever, mas também pra ler. Meu primeiro romance comunista. E eu pensava, pra cada lágrima que tu derrubava de mim, que qualquer dia escreveria essa história. Não escrevi. É difícil ler também, o que tem de escrito da nossa história. Talvez seja difícil ouvir também, os discos que me deu de presente, outros que esqueceu. Guardo todos, no entanto.

344 de muitas: somos nós, letra e desejo.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Quarta-Feira

Ressaca

E talvez você quer que eu queira que você queira me querer. Mas eu estou firme e forte na decisão de te querer contido, em silêncio com súbitas confissões devido ao álcool ou alguma alegria daquelas que nos assaltam e faz a gente confessar as coisas e justificar sorrisos. Querendo ou não, suas perguntas me fizeram pensar o porquê de não ter sido capaz nos últimos anos de manter relações. Ótima em começos, péssima em fazer durar. relações curtas e intensas. Será isso, então, a história das próximas relações? Sou namorável? Sou capaz de sustentar uma relação ou serei no futuro um acúmulo de histórias fragmentadas, passageiras, ainda que intensas?

...
A gente não quer só comida
na fila do lanche

- ...mas nossa relação é meio estranha.
- não acho estranha. tenho relação mais estranhas. por exemplo com a...
- ...é sempre assim! eu começo a falar da gente e tu começa a falar das outras...é tão difícil?
- quer mais queijo?
- sim.
- não é difícil. eu gosto de você, de conversar com você e de estar com você...
- alface, tomate e pepino?
- sim, valeu.
- ... não vejo nada de estranho nisso...nós ficamos, nos gostamos, é isso.
- deseja algum molho?
- uhmmm... tem parmesão? a gente divide refrigerante?
- tem, sim.
- sim, vamos dividir.
- sprite ou fanta?
- tanto faz.
- pra mim também tanto faz.
...
A força que nunca seca.

Haja esforço pra tentar calar. Está por todo o mundo, em todas as esquinas, por todos os bairros, escolas, fábricas. Sempre há alguém que recusa o silêncio, que abre a boca pra falar. Que lembra que não adianta anunciar a morte, forçar o enterro, fingir que nunca existiu. "Os poderosos podem matar uma, duas, três flores, mas jamais deterão a primavera"*. - diz um dos tantos que permanecem vivos na história. É a contradição, a dialética, o movimento. Sempre terá alguém, ainda que minoria em meio a tantos olhares mortos, alguém que sabe que nada deve parecer impossível de mudar* (diz um outro dos tantos que permanecem vivos na história). E são tantos os assombros, os desânimos, os ataques de tantos lados... mas basta conhecer uma dessas tantas pessoas que a possibilidade de transformar torna-se real. A vontade de mudar fica viva. Essa força estranha, que nunca seca, essa chama acesa que mantém viva naqueles que sonham acordados com o despertar de um outro mundo. Seguimos fortes, escrevendo - e muitas vezes reescrevendo - a história.

* citação de Che Guevara e Brecht, respectivamente.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

fudeu.

e dizer: gosto de você e penso em você e queria você e agora e aqui e é isso. sem suco sem restaurante sem horário comercial sem pudor sem poder sem pavor. dizer tudo de uma vez sem medo. larga tudo e vem comigo sei lá onde sei lá porquê sei lá pra quê. porque é bom, porque faz sentido porque é isso. de repente te quero como você e como eu, como um nós que já sei que existe embora tentamos esconder, tentamos conter, tentamos dizer que é só ilusão e deixa pra lá e toma um café e segue pra vida e faz tua reunião e tu faz teu show de sempre.


...


mas e se de repente a gente confessar tudo de uma vez e a gente bota uma chuva na história que fica mais dramático e alivia o calor e eu digo tudo de uma vez e tu ouve tudo de uma vez e eu abro um sorriso e tu me agarra e eu subo em ti e te abraço com as pernas com os braços com a alma e tu me beija e eu te beijo e a gente se beija e ia ser bom... ah! ia ser bom...

a gente se adora a gente se quer a gente é a gente (já existe um "a gente") e sem fazer sentido nenhum isso fez sentido (vai entender que coisa é essa) e eu queria agora como uma criança que esperneia no chão dizendo: agora agora agora agora agora. e tu eu sei que quer também, se não quisesse não estaria aqui, querendo inventar uma chuva para me agarrar e me dar um beijo e a gente se enfiar num canto e se amar de uma vez só. uma vez num só gole não sei mas que seja de repente e que seja intenso e que dure o quanto tiver que durar mas que haja algo concreto. preciso de ti concreto viver você engolir você beber você sentir você chorar você rir você abraçar você beijar você. tudo sem gelo e sem açucar num só gole, em uma só viagem de ida e sem volta. tu é caminho sem volta, passagem só de ida. história que sei lá porquê de hai kai virou romance sem final. seremos, nós, felizes para sempre? com ou sem catupiry, com ou sem você, espero que sim. no duro: te gosto o suficiente para querer a tua e a minha felicidade, pra sempre.

confesso assim, meio torta, meio bêbada, mais sóbria que gostaria, mas ainda sem a lucidez necessária para conter dizer essas boas verdades que seguem: cara, acho que tô apaixonada. e agora?

domingo, 9 de dezembro de 2012

Daquele que salva do abismo.

Os dois se encontram, de longe se reconhecem. Ela não muda a expressão séria e ele em um primeiro abre um sorriso e depois faz cara de que tenta entender a expressão séria.
- Oi. - diz, surpreso, contente e ao mesmo com olhos de quem tenta entender.
- Agora não. - ela continua andando, séria
- Eita.

"Agora não" - Não queria lidar com ele, naquela hora. Seus cabelos despenteados, a roupa não era das mais adequadas. Para além dessas futilidades, não sentia que existia intimidade o suficiente para que ele conhecesse seu lado sombrio, depressivo, conhecer seus olhos que ficavam mais claros quando chorava (embora ele já conhecia os olhos mais claros pós-orgasmo e adorava aquilo). Ele não estava preparado ainda para tal intensidade. Ele desvia o caminho para o mesmo dela, caminhando ao lado. Seguem em silêncio.

- Posso ajudar com alguma coisa?
- Não.
- Quer sentar em algum lugar pra gente conversar?
- Não. - ela apressa o passo.
- Posso te acompanhar? - ele apressa o passo também.

Ela fecha os olhos. Tenta conter sua tímida felicidade. É claro que queria a companhia dele. Era tudo que ela queria o tempo todo. Ele fica sério por um instante, tomado por uma ideia perturbadora:


- Não é por um outro homem que está assim, né?
- Não!
- Ah, tá bom. Então, posso te acompanhar?




- ... eu fico em silêncio, prometo, se assim preferir.
- Se eu disser que não, você vai parar de me acompanhar?
- Não.
- Imaginei... 

Ela esboça um sorriso, muito breve. Ele abre um sorriso grande. Lindo.

sábado, 8 de dezembro de 2012

Um primeiro esboço

Ela chama de "escolha libertária". um jeito bonito de dizer que estamos sozinhas. Bom, fato é que não estamos mesmo, mas ás vezes parece isso: uma militância. Falamos de outra coisa, embora não sabemos do que é. Viver romances, parece algo tão simples na minha cabeça, mas ao querer viver isso parece tão complicado.

 "Como assim não quer casar?".
Se sentir como ser uma "moderninha" da década de 20. Não se trata de uma luta para não se casar. Vejo histórias lindas, casais que quando briga sofro junto, pensando num possível término. Trata-se de ser contra a procura desesperada de um marido. É tão terrível assim acreditar que as histórias acontecem para além dos contratos matrimoniais, que pelo menos no amor e na paixão não nos renderemos às exigências do capital (casar-e-ter-filhos)?
Custou um tempo para confessar isso, porque relutei para acreditar que esse pensamento ainda existe. E aí ao pensar duas vezes, de fato não é tão absurdo. É o que explica o repúdio ao aborto e relações homossexuais e homoafetivas. Aquelas pessoas que fazem uma "escolha libertária" e constroem outro significado para amor,  afeto, família, companheiro, companheira, desafiando a norma de conduta atual. E como se acostumar com o fato de nos acostumarmos com o fato de que somos submetidos a um modelo de como nos relacionar! Isso já é um motivo pra lá de suficiente para se tornar comunista!

E nos esforçamos em provar que a mentalidade do príncipe-que-nos-troca-por-cabras-com-o-pai não é tão distinta da mentalidade do não-quero-um-relacionamento-sério ou vamos-só-curtir. Ambos são regras que colocamos acima do desejo. Relações fulgazes e superficiais ou a procura de um esposo-príncipe - são essas nossas escolhas? Não, muito obrigada. E que não seja nem o meio disso, uma espécia de "equilíbrio". Na tentativa de classificar as coisas, matamos o que há de espontâneo e nem sempre explicável. E para que o inexplicável caiba nessas regras, somos obrigados a reduzir o que sentimos, restringir nossa forma de se relacionar com as outras pessoas.

"Não pode ser assim. Não deve se jogar de cabeça... podemos só curtir.". 

não pode.
não deve.
não.
não.
não.

Regras que organizam o inorganizável. Incrível como precisamos dessas coisas para viver em relação com as outras. Por que não dizer: "EU não quero me jogar de cabeça"? Vontade de responder:
Surpresa: não trago nem véu, nem buquê, nem aliança, nem segredos escondidos.
Era vontade, muita vontade. Isso que trazia. Vontade de ficar junto. Mas agora passou.
E a burocracia venceu mais uma vez.

Mas jamais entenderia. Então respondemos: "ok". E seguimos com a "escolha libertária".


quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Assombros

Às vezes, pequenos grandes terremotos
ocorrem do lado esquerdo do meu peito.
Fora, não se dão conta os desatentos.
Entre a aorta e o omoplata rolam
alquebrados sentimentos.
Entre as vértebras e as costelas
há vários esmagamentos.
Os mais íntimos
já me viram remexendo escombros.
Em mim há algo imóvel e soterrado
em permanente assombro.

Affonso Romano de Sant'Anna, 1937

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Do pré-começo

Era de tarde quando me flagrei pensando em você pela primeira vez, três dias depois de te reconhecer. Sim, a primeira vez que nos vimos não nos conhecemos. Reconhecemos, eu a mim mesma, tu a ti mesmo, nós um ao outro. Era como se tudo e nada tivesse mudado naquele momento. Era tudo que tinha mudado, porque estávamos, enfim, no mesmo ambiente. Era como se nada tivesse mudado porque parecia que aquilo não parecia acaso - por mais que tinha uma série de acasos que vínhamos a saber depois - e não parecia surpresa ou novidade, era como se aquele momento em que nossos olhares se cruzaram estivesse no script. Explico: o momento que alguém entra em cena nas nossas vidas só passa a fazer sentido depois que ela se torna um personagem definitivo. Na hora, é apenas um figurante, alguém que passa como tantas outras pessoas que passam. Não foi contigo assim. Na hora que tu entrou em cena na minha vida, eu já sabia que tu era personagem, e não figurante. É como se soubesse que aquele roteiro seria bom, e renderia boas cenas em bons cenários.

Mas enfim, era de tarde quando me flagrei pensado em você pela primeira vez. Em um primeiro momento me espantei. Ter você em meus planos não estava nos meus planos. Mas deixei, como uma memória gostosa, aquele "e se" que nos faz pensar que a vida é bela e reserva surpresas e possibilidades. Até que nos reencontramos, por um acaso, duas semanas depois, e eu agi como se nada aquilo fosse. Geralmente eu me alegro ao ver pessoas que simpatizo e reservo algum carinho. Abro sorriso, abraço e beijo. Não quando essa pessoa me atrai. Daí eu faço cara de indiferença e digo "e aí?" pra disfarçar o coração que pula. E o coração pulando e a aparente indiferença foram o que me fez ver que eu estava interessada. Contigo foi mais ou menos assim, mesmo. Estávamos em uma roda com várias pessoas de vários lugares, algumas das quais eu chamava de amigo. Eu só queria saber da onde tu vinhas e o que fazia ali, na roda dos meus amigos. Quem trouxe essa pessoa pra cá, invadir meu espaço meu canto meu mundo? Tu se distancia para fazer algo no celular e antes de retornar a roda eu rapidamente me coloco no meio do caminho. "E aí, tem fogo?". Também com pose de indiferente, disse: "não.". Respondeu firme, seco, bruto. Pensei em provocar, falar alguma besteirinha. Eu sorri.
É claro que não tem, tu não tem jeito de que fuma.
Tu volta a olhar para o celular e eu mantenho o cigarro na mão, olhando a volta algum isqueiro. Tu poderia ter voltado pro grupo mas ficou ao lado.
Ei, me empresta o fogo aí? - eu digo, para um cara muito mais alto que tu, que sorri e acende pra mim o cigarro. Tu olha torto para o cara mas disfarça rapidamente olhando para o celular - Valeu.
Volto a olhar pra ti. Tu fecha o celular e diz:
Tu não me conhece pra saber se eu fumo.
- Oras, quando saímos de um ambiente fechado para pegar ar, há duas saídas quando se vai sozinho: (1) tomar ar fazendo algo no celular, (2) acender um cigarro. Ou fazer as duas juntas, mas tu faz o tipo que não consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo. Nesse caso, um fumante sempre optaria por um cigarro, e não pelo celular. A não ser que tu tenha alguém que não está aqui e queira falar com a pessoa.
- Não há um alguém. (eu abro um sorriso) - Toda essa falação foi pra descobrir se eu estou acompanhado?
- Não. Foi só para entrarmos no assunto. - você sorri olhando pra mim, e puxo um trago olhando pro muro.

Alguém te chama. Tu não diz nada com a boca, só com o olhar, e vai - "merda", penso eu. Passamos o resto da noite nos olhando e nos despindo famintos, com o olhar. Na minha roda o assunto era política e na tua era música, mas era a mesma política e a mesma música e poderíamos muito bem sair daquele mais-do-mesmo-de-nossas-vidas e viver essa novidade que pulsava - a vida chamando - mas não fomos. Covardia, talvez.

Dia seguinte tu é o primeiro pensamento da manhã, aquele que vem seguido do "que horas são agora?". Tudo bem, confesso que não é preciso muito para ser meu primeiro pensamento da manhã. Basta um sorriso bonito, um olhar que desperte curiosidade e a pessoa já está ali, ocupando esse ofício. Mas contigo foi diferente. - porque o caso mais recente é sempre "diferente", até que tudo acaba e ele passa a ser "como os outros", e a gente sempre fala isso na esperança de alguém que de fato permaneça como "diferente". Ao longo da minha vida de muitos primeiros-pensamentos-na-manhã, dois ou três de fato foram.

Fato é que depois de tu virar assombração bonita do meu cotidiano, não me restava nada além de te procurar, e descobrir afinal quem era essa pessoa tão disposta a me tirar o sossego. Eu fui ao teu encontro, sem saber se daria samba, se teria lua e se seria alegre. Não havia expectativas, mas uma curiosidade de tirar o sono. Era agora teu território, teu bar, tua cidade.
- Achei que não viria nunca. - tu respondeu, ao me ver novamente, já encostado no carro e com a chave na mão. - Vamos?, diz, abrindo a porta do carro.
Sorri. Entro no carro e ouço a música. Naquele momento eu soube. Para qualquer caso poderia ser perigo, para ti significava que me esperava. Era a nossa banda, ainda que não tivéssemos firmado esse acordo em lugar algum. Tu entra no carro, e eu sento de lado olhando pra ti.
- Tu sabe que isso vai dar história, não é?

Sorrimos um ao outro, enfim. Era a primeira vez que olho encontrava com olho e sorriso com sorriso. Antes era uma dança maluca que envolvia desvios e rodeios e devaneios. Agora nos olhávamos e nos sorríamos e o mundo estacionou. E a estrada era pouca para tantos caminhos que trilharíamos juntos.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Não existe amor em SP (!)

"...não sabes desse meu mar porque nada digo, e temo que seja outra vez aquela coisa piedosa, faminta, as pequenas-esperanças, mas quando desvio meu olho do teu, dentro de mim guardo sempre teu rosto e sei que por escolha impossível recuar para não ir até o fim e o fundo disso que nunca vivi antes e talvez tenha inventado apenas para me distrair nesses dias onde aparentemente nada acontece e tenha inventado quem sabe em ti um brinquedo semelhante ao meu para que não passem tão desertas as manhãs e as tardes buscando motivos para os sustos e as insônias e as inúteis esperas ardentes e loucas invenções noturnas, e lentamente falas, e lentamente calo, e lentamente aceito, e lentamente quebro, e lentamente falho, e lentamente caio cada vez mais fundo e já não consigo voltar à tona porque a mão que me estendes ao invés de me emergir me afunda mais e mais enquanto dizes e contas e repetes essas histórias longas, essas histórias tristes, essas histórias loucas como esta que acabaria aqui, agora, assim, se outra vez não viesses e me cegasses e me afogasses nesse mar aberto que nós sabemos que não acaba assim nem agora nem aqui."

Caio Fernando de Abreu, À beira do mar aberto, do livro Os dragões não conhecem o paraíso. 


- - -

Em meio a sua histórias infinitas, contadas como se fosse a primeira vez que tivesse a oportunidade de contar histórias longas e com medo que isso acabe conta rápido para que aquele momento caiba mais histórias longas possíveis, te interromper e dizer: chega! Foda-se Jorge, Ana Carla, Brenda e todas as outras e todos os outros. Eu quero é saber de ti, de nós. Quando é que chegamos no nosso capítulo dessa história sem fim? Já tomamos todos os sabores do suco e agora chegamos nos dois sabores - em breve alcançaremos as vitaminas das mais criativas e ainda não resolvemos aquele desejo pendente. Não falo nada.

Vê um de goiaba, por favor.

Teus joelhos comiam meus joelhos por debaixo daquela mesa em um discreto encostar das pernas sinalizavam como elas queriam era estar entrelaçadas em algum lugar, embora continuávamos falando da Ana Carla.

E quanto mais falamos, mais pensamentos sórdidos aparecem nos cenários que passamos, formas de fazer o que falamos de não-fazer - onde eu poderia me esconder contigo e fazer tudo aquilo que já prometemos e mais?. É como aqueles inseticidas que ao invés de matar o mosquito deixa ele mais resistente e forte. Tentamos tantos inseticidas - verborragia, atividades amenas como caminhar no cinza de São Paulo, músicas tristes, poemas suicidas - mas o tesão segue vivo, em chamas, esperando ser consumido.

- Tem medo.

Fico calada. Tu inventou um outro jeito - muito menos agradável - de me colocar contra parede. E fiquei alguns dias a sofrer com isso e pensar em tudo que me acusa, até que revendo as cenas e as conversas e tudo que já passamos vejo que todo esse ataque é para que eu não veja o teu medo. Essa tua mania desagradável e sedutora de blefar. Já assumira outras vezes que furei tuas defesas. É nisso que parece um menino. Encontrei você por trás de todas essas roupas de gente grande que vestimos ao longo da vida no passar dos anos, para que ninguém nos encontre - não é para qualquer um que nós despimos, pelo menos não dessa forma. São poucas as relações - e menos ainda as trepadas - que nos fazem tirar esse tipo de roupa, e nos permitem esse tipo de nudez. Ficamos vulnerável assim e é perigoso demais.

E então assumo: tenho medo, sim. No fim das contas queria entender se é o meu sexo, ou os meus textos, ou o olhar que te dei e ficou... e se é tudo junto, não é demais? Três motivos ou mais para se querer alguém, deve haver alguma teoria sobre isso. Tu não percebe o peso de suas confissões. E se percebe, não fala sobre isso. E se não diz, não sou eu que vou falar.

E pra não falar, mais uma vez, do que não é pra ser dito mas vivido, sigo com meus pés a caminhar. Meu pensamento acompanha a passos lentos os passos apressados da cidade, retomando fala por fala, gesto por gesto, cada insinuação e cada desaforo teu, de forma perturbadora. Te ouvia falando mil coisas ao mesmo tempo, e os olhares - aqueles para mim e para a mesa, meio tímido, meio constrangido mesmo. Os olhos encheram de lágrima mas não era tristeza, não era alegria, não era qualquer uma dessas dicotomias. Era uma tremenda paixão que já não cabia mais, um sentimento de que isso precisa ser logo experimentado pois as veias já não aguentam esse sangue quente de vontade de você.

Isso, e o ar poluído de São Paulo que fode com a minha saúde e faz meu olho arder.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Descobertas, Descobertos.

Quero saber se prefere sábado ou domingo, Machado de Assis ou Dostoiévski, açúcar ou adoçante, sonhar ou viver, futebol ou porralguma, sorvete ou doce de leite. Se gosta de pouco-tempo-com-muita-intensidade ou muito-tempo-com-pouca-intensidade. Feijoada ou churrasco. Truco ou buraco. Só ou mal acompanhado. Bob: Dylan ou Marley. Primeira ou Segunda Guerra Mundial. Sexta Feira 13 ou Brinquedo Assassino. Sentir sono ou sentir frio. Doce ou salgado. Saber se alguma vez na vida já acordou de madrugada para assistir a Fórmula 1, se já foi fazer uma prova sem saber de nada - ou sequer sabia que era dia de prova. Se já cantou alto alguma canção pensando em mim, no chuveiro, ou pela casa ou enquanto cozinhava ou mesmo na rua. Saber se já se vestiu de mulher e se gostou. Se alguma vez teve vontade de ir para Disney. Se já se escondeu quando criança para ver quanto tempo demoraram para sentir a tua falta. Se fugiu de casa quando era criança, e o que levou contigo, e até onde foi. Se tem cicatriz, e qual a história dela.

Qual o primeiro livro que leu e qual o primeiro disco que comprou. Qual foi o último filme que chorou - se já chorou e porquê. Se tem saudade, se quando deixa de amar esquece, se já chorou de alegria, se já fui teu primeiro pensamento do dia alguma vez. Preferia Xuxa ou Angélica (Eliana, entra na história?), Globo ou Record, sapato ou tênis, Natal ou Páscoa. Quero entender por que seu sorriso é assim meio tímido, meio de lado, como se não era para ser. Tem medo de ser feliz? Ou medo que te tirem o sorriso? Tem medo? Saber porquê não gosta de incertezas manifestas nos meus "não sei". Se na água gelada entra com tudo ou molha primeiro as pontas dos dedos. O que pensa sobre MST, pena de morte, aborto, entre outras polêmicas.

Quero descobrir você, pois já me sinto descoberta - ainda que guarde alguns segredos para te contar aos pouquinhos, como em doses homeopáticas. Quero inventar assuntos e perguntas. Aprender a surfar ou a dançar tango, algo que eu possa me gabar e então te convidar para que te ensine. Ver muitos filmes e ler vários livros, conhecer lugares diferentes e viver histórias para que haja mais de mil motivos para mais de mil convites para sucos que serão tomados em São Paulo, Natal, Amsterdam, Hong Kong ou onde for.

Sigo com venda nos olhos que eu mesmo botei para nas linhas tortas ir atrás de ti, meio bêbada, meio sóbria, um tanto sonolenta e muito esfomeada de ti. Um ato inconsequente-consciente. Entre sucos, histórias e confissões clandestinas seguimos assim: Tu, objetivamente comprometido com outra mulher. Eu, subjetivamente comprometida contigo.

Quando me perguntou, pra onde vamos o que faremos ou algo do tipo, fiz cara de indiferente e não quis dizer, preferindo enfiar o garfo de arroz-feijão na boca e fingir que era esse o motivo do não falar: estar de boca cheia. Queria dizer: eu preciso de você. E dizer teu nome, olhando no fundo de teus olhos. Não encontrei um jeito de dizer isso sem assustar. Nessa sociedade em que vivemos, confessar que precisa de alguém é quase um pecado, ou uma declaração de fraqueza absurda. Não é atraente precisar. Pessoas auto-suficientes são as charmosas. As que precisam, queremos distância, sem perceber que no fim das contas não existe essa tal auto-suficiência, e que precisar não é doença. Te precisar é daquelas necessidades que inventamos e na impossibilidade de termos superamos, inventamos outras e a vida segue.

E seguirei precisando de ti até que venha a placa "PARE!". Quem erguerá a placa, não está definido. É ilusão minha dizer que sou eu, presunção tua dizer que será tu. Quando ela aparecer, vou virar artista para pintar quadros de bolas e quadrados e triângulos de várias cores e tamanhos que irão simbolizar amor-de-primavera ou som-da-cachoeira-aos-domingos ou qualquer coisa assim meio-cafona-meio-cool-meio-poeta-fake e totalmente incompreensível, nome de invenção de artista que só eu entenda (ou nem eu).

Eu e aquelas pessoas com ar de sabido, pseudo-intelectual-acadêmico-de-buteco, óculos de grau e cabeça inclinada um tanto a esquerda, com olhos analisando a obra de arte travaremos um longo diálogo sobre o significado da escolha pela espiral posicionado na centro-esquerda e que certamente envolverá Deleuze.
A obra principal terá teu nome, e espirrarei tintas de cores novas que inventarei para tentar traduzir o inexplicável gostar de ti.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Quase Morte, Quase Vida

Ele estava feliz. Quase havia morrido aquele dia. Seus olhos passavam paz, uma serenidade surpreendente, sobretudo em um ônibus velho intermunicipal ao final do expediente. A experiência de quase morte talvez valha dois anos de aprendizado em vida. Percebemos aqueles que se distanciaram - seja por um motivo bobo, ou mero descuido e pensamos em retomar contato. Coisas que de repente somos tão apegados - como o carro que quase provocou a morte - parecem tão pequenas. Dinheiro. De que adiantava trabalhar tanto se não tinha tempo de viajar sequer uma vez para uma outra paisagem?

Sua serenidade transformou-se subitamente em angústia. Todos os dias, são tantas quase mortes e mortes efetivas. Vidas que se foram, e o que fica? Aquilo lhe causou tamanha angústia. Se tivesse ido embora aquele dia, para sempre, o que havia deixado pro mundo? Não se tratava de escrever um livro, plantar uma árvore ou ter um filho. Queria mais. Perguntamos constantemente o que fazer de nossas vidas, se compraremos um carro ou faremos uma viagem, se seremos médicos ou engenheiros, prostituta ou faxineira, com filho ou sem filho, Folha ou Estado... mas que porra de mundo é esse, afinal? Será um amontoado de vidas fragmentadas que montam a história de uma geração de toda uma espécie humana?

E a vida de um ser humano? Fragmentada em dias, momentos, pequenas alegrias para satisfazer o próprio umbigo? Ele era um bom amigo, bom filho, bom irmão, bom professor... sabia que, caso encontrasse alguém, seria um bom companheiro. Viver é isso? Ser alguém bom com as pessoas? Sentia que era tão bom que não fazia diferença nenhuma - era alguém que estava sempre ali, não fazia mal a ninguém, não incomodava. Viver é não incomodar ninguém? Também não dizia nada de brilhante para ser lembrado. Não havia inventado coisa alguma, não havia descoberto a cura para alguma coisa, não havia sequer conseguido terminar o Simpsons no mega drive (jamais havia se perdoado por isso). E mesmo que tivesse... vida seria isso? Pequenas ou grandes glórias acumuladas?

Aos poucos, tranquilizou-se de novo e então começou a se animar. Uma quase morte é sempre um renascer, a possibilidade de ver o mundo com olhos de quem por pouco quase não esteve mais nele. Sabia que teria que fazer algo. Enquanto isso, vinte e cinco pessoas olhavam o nada dentro daquele ônibus intermunicipal, ao final do expediente de uma sexta feira. Estavam todos cansados, e alguns ainda planejavam o seu fim de semana. Uma senhora lembrava que havia sobrado frango da noite anterior e foi tomada por uma pequena alegria. Alguns cochilavam... faziam aquele caminho há anos e o corpo já acostumara a acordar no ponto certo de descer. Ele olhava para cada uma daquelas vinte e cinco pessoas e pensava em chamar para algo. Dizer algo bonito sobre o mundo, sobre a vida, a humanidade. Propor um momento de reflexão coletiva. Seu coração batia forte, antecipando um momento único de sua vida, o momento que faria a diferença. Estava acelerado e em sua cabeça surgia um lindo discurso que sequer sabia ser capaz de fazer algo tão belo e profundo. Pela primeira vez sentia orgulho de si - afinal, estava prestes a fazer algo.

Sua boca foi abrindo para verbalizar o discurso, sua garganta já estava preparada, estava suando apesar do frio, suas mãos estavam contraídas, até que foi tomado por uma súbita vergonha. "Que bobagem! Isso não fará sentido algum para essas pessoas, e vão achar que sou louco". Tirou o jornal de sua pasta, ele estava meio perdido em meio a provas para corrigir. Começou a ler as manchetes, anunciando as mortes na periferia, uma receita de bolo, o Palmeiras indo de mal a pior. Pensou em ler seu horóscopo, para ver se os astros previam aquele dia de cão que tivera. Seu horóscopo falava sobre ser um dia de tomar decisões, coisas que todo horóscopo alerta para algum signo todo dia. Sentiu-se bobo por ter feito isso e ficou com vergonha novamente.

Já não sentia mais angústia ou ânimo, ou coisa alguma. Estava "normal", como gostava de estar. Nunca entendeu essas pessoas que se descontrolavam com ataques de riso ou de choro. Mantinha-se com sua cara serena, sua pasta próxima do corpo. Olhou para a janela e viu que desceria no próximo ponto. Deu o sinal e ficou na porta esperando. Ele quase havia morrido aquele dia. Feliz que isso não ocorreu, voltou para a sua quase-vida de sempre. Deitou em seu travesseiro calmo, satisfeito que já estava de novo no conforto de sua casa. Dormiu pensando que poderia ter suas oito horas de sono, e que a partir do dia seguinte teria mais cautela, para não passar por outras experiências de quase-morte.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Do que não cabe.

Ele pensava em filhos e onde é melhor comprar uma casa e ela queria sair daquele apartamento e mudar o mundo - ou pelo menos os móveis de lugar, pois aquelas poltronas voltadas para a televisão me incomodava horrores. Discutiam muito até o coração dizer chega, que se continuar estraga a paixão. Então iam para a cama onde se entendiam bem - onde tanto faz se era Moreno, Rosa, Mandel ou Kautsky. Primeira, Segunda, Terceira ou Quarta Internacional. Até a Quinta, que fosse. Partido ou Inteiro. Tanto faz. Eram os dois naquele quarto sujo cheio de roupas e rascunhos espalhados, alguns isqueiros já sem gás, e pintura desbotada. Acendiam um cigarro depois e então retornava:

Você estava dizendo, sobre o ciclo PT...


...


- Que foi? - pergunta séria, parando um pouco o que estava fazendo ao ver que estava sendo observada.
- Nada. Estou te vendo. - ele responde, quebrando qualquer dureza que existia entre os dois.

Assim eram, como esse diálogo. Individualidades que se encontraram, e com toda a dureza e aspereza, ainda havia carinho permeando pelos poros. Essa quebra era parte do que os constituía enquanto casal. Ela tentava mostrar para ele aquilo que ele escondia dele mesmo. Ele a via como ninguém antes havia se proposto a ver. Eles se notavam, se percebiam um ao outro com suas nuances todas. Mas a casa era pequena demais para caber o amor dele e as vontades dela.

...

Um ano, alguns meses e minutos depois sentaram em um bar e tomaram cerveja. Muitas, como sempre, com os altos e baixos de sempre. Palavras duras, o debate agora sem carinho - ou pelo menos tentava- , tentavam dizer um ao outro que não eram mais café-com-leite, que o coração não iria mais dizer chega e então poderiam fazer o debate duro exigindo que o outro sustente teus argumentos. Falaram de músicas, mestrado, livros, academia, amigos - quem casou, quem morreu, quem separou... - partidos, conjuntura, um jornal vendido... até que chegaram ao ponto: nós. Debate duro. Ele não falava mais de filhos. Ela já não se incomodava mais com o mundo tampouco com os sofás voltados para a TV. Ainda assim, havia algo sem cabimento naquela relação, e um impedimento para o tentar de novo. Terminaram novamente.
Na despedida um abraço, e um choro involuntário nos ombros dele - ombros que sempre fizeram chorar, não por causar tristeza, mas por permitirem ser triste.
- Me liga quando quiser.
- Ligue você quando quiser.
- Você sabe que eu não vou ligar.

Andaram cada um para seu lado, sem olhar para trás.
Nunca mais se viram, embora tenham se encontrado algumas vezes depois.

Nota de Suspensão


Amigo leitor está suspenso por tempo indeterminado neste blog de um leitor só. Deixemos de lado a tua procura por mim, por você, por nós nesse recinto e tentemos nos entender na vida real, lá fora. Deixemos de ser personagens, passemos a ser gente.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Encantamento Fudido


Somos aquele momento entre a possibilidade do beijo e o beijo concreto. Estamos em uma condição permanente desse estágio, uma sensação um tanto angustiante mas também extremamente prazerosa. Gosto de você e de gostar de você e do que isso me causa: me bota para escrever, pensar, me tirar do lugar. Pode parecer que tudo que uma pessoa como eu não precise é sair do lugar, já que está o tempo inteiro saindo de um lugar para outro - o mesmo contigo, imagino eu. Eu me acomodei nessa condição incômoda e alguém parar e me perguntar: "tu é assim, por tua conta mesmo, né?" me faz pensar se sou, e, caso seja, se quero ser. Faz com que eu lembre de como já fui feliz assistindo a um filme sexta a noite com alguém que eu gosto.

Em tempos que já fui feliz quando a única certeza era quem estaria me esperando em casa, e não o que eu faria. Encostar no ombro, enroscar as pernas, poucas roupas e muitos carinhos. Tendo frio, uma coberta. Enrolar na cama pra começar o dia. Seria algo incompatível, mudar o mundo e manter as pernas enroscadas com alguém? Seria condição determinante manter as minhas pernas livres de outra qualquer? Veja Rosa Luxemburgo e Leo Jogiches, Marx e Jenny, Trotsky e Natasha, que sobreviveram durante revoluções e exílios que envolviam Polônia, Sibéria e tantos outros lugares.

Além da minha suposta auto-suficiência, tu fala do meu não-sorriso e que estou séria e eu percebo que não sou de muitos sorrisos em São Paulo. Pode parecer capricho meu, mas essa cidade me endurece demais. As batidas de ombro, os olhares tristes, os muitos tons de cinza, os cigarros desviados, os pés que correm pelo asfalto, o correr do tempo. Há muita pressa e pressão e pouco espaço para apaixonamentos e outros momentos que exigem a câmera lenta, a pausa pro olhar, pro sabor. Para além disso, existe o casco e a máscara de sonsa para tentar disfarçar o turbilhão de dentro de mim, a vontade de pular em ti e te levar pro banheiro sem ligar o que o garçom irá pensar. Seguimos seguros brincando com canudos e falando de Machado de Assis.

Essa ambivalência entre o excessivo pudor e o incontrolável tesão leva ao ápice de um beijo roubado e bruscamente recuado. Jamais me perdoarei por não ter prolongado cinco segundos que fosse aquele beijo. Quem vencerá - o excessivo pudor ou o incontrolável tesão, não sabemos. Enquanto isso, nos mantemos nesse momento permanente da possibilidade do beijo e a concretude do mesmo. Dos olhos que se cruzam e ficam, e as pupilas se alteram. Dos lábios que lentamente se molham para receber a outra boca. Do coração que dispara ao pressentir que tem novidade no ar. Do corpo que fica em êxtase preparado para sentir outro corpo. Por quantos dias ou semanas ou meses é possível manter nesse estado, eu não sei. Estamos desafiando as leis da física, química, biologia.

O que dá medo nessa história não é do fim ser bom ou ruim, mas justamente da possibilidade de ter seu desfecho. Independente do conteúdo, chegar a última página desse romance parece algo doloroso, como aquele livro bom que não queremos que termine, ao mesmo tempo que estamos curiosos com o que vai acontecer com as personagens. Caminhar contigo sem saber pra onde dará está tão gostoso, diante de tantas respostas que devo dar o tempo inteiro sobre pra onde e quando e como ir, o que fazer, com quem e todas essas questões que a vida e a família e os amigos e os compromissos nos exigem responder. O teu me tirar do lugar me faz bem, teus atos e dizeres de menino-homem são tão puros e bonitos - vida no teu sentido mais cru e bruto. Descobrir a tua vida, nos descobrir juntos e me descobrir também, brincar de criar um "nós" de forma tímida com breves momentos de ousadia é uma experiência tão bela na tua singularidade.

Qual será o desdobramento? Seria um só? Pra onde vamos? Seria essa questão? Ou a questão nunca foi "o que faremos" como se existisse uma finalidade ou uma meta, enfim? Talvez seja isso. Estamos fadados a ser caminho. Estrada paralela de nossas vidas que não se cruzariam se não fosse essa rota que inventamos, em que não há sinais e placas visíveis para outras pessoas que não nós dois. Sem desistir da estrada velha de cada um de nós, com nossas parceiras e parceiros, obrigações e prazeres, nos buscaremos nesse caminho secreto vez ou outra pelos quatro cantos do mundo, quando for pra ser. Cuidemos apenas para que não nos leve a lugar algum, independente de ser para um lindo paraíso ou a um abismo. Basta aprendermos a hora de voltar, pra boa e certa estrada de cada um, respeitando a pausa permitida pro almoço ou o horário do próximo vôo ou a próxima reunião.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

"Eu não presto"

- Eu não presto.
- Pra quê?
- Pra vida.
- Pra quem?
- Deixa pra lá. Tu é muito chato.


- - -

Sempre considerava que era uma pessoa organizada. Não sei quando me tornei o esteriótipo da confusão. Foi de repente um dia que fui pega de surpresa ouvindo "Precisamos sentar um dia, estou com saudade das suas histórias". E aí eu percebi: me tornei o entretenimento dos amigos ordinários, que faziam coisas ordinárias e levavam uma vida ordinária - grande parte comprometido com outra pessoa ordinária. Não faz tanto tempo e eu era uma pessoa ordinária que fazia coisas ordinárias e levava uma vida ordinária.
De repente eu sou essa confusão, tentando conciliar várias confusões e seguindo, fazendo, falando, bancando as irresponsabilidades e consequências dos atos irresponsáveis. E que os amigos riem, como que assistindo uma macaquinha que de forma atrapalhada tenta fazer alguma coisa dentro daquele aquário esquisito.

- - -

Eu não queria, mas deixei ele esperando meia hora a quarenta minutos em frente ao metrô. Cada cinco minutos pensava que havia fumado um cigarro. Cheguei. Descabelada, com milhões de envelopes, suada, um sorriso e uma cara de pau, perguntando:
- Conhece um correio aqui perto?
Ele olhou e fez cara de tanto faz. Mas quando nos abraçamos senti seu coração disparado, e escondia um sorriso por ter me encontrado, ainda que atrapalhada como sempre. Lá fomos nós, correndo em busca de um correio, percorrendo caminhos que antes fazíamos de mãos dadas, e beijos no farol. Eu tentando arrancar sorrisos, ele tentando se manter sério.
- Alguma novidade?
- Não.
- Nada? Não é possível não ter novidade.
- Não. Nada mudou nos últimos meses.
- Ai, peraí. - tentando me virar com o tanto de envelope, enquanto ele segue na frente, com jeito de impaciente. - Pronto. Então, não é possível que nada tenha mudado nos últimos meses.
- Bom, é isso. Ah, talvez eu mude para Alagoas. Ah, vai, me dá logo isso aqui - impaciente com as minhas atrapalhices, toma a sacola de envelopes da minha mão.
- Achei que não ia pegar isso nunca - falo, com um sorriso de aproveitadora.
- Se depender de você com essa sacola a gente não chega nunca nesse correio. - você segura o sorriso pra manter sua cara de tantofaz.

A gente sorri. Éramos nós novamente. Ele com seu mau humor desaforado, casca inventada para proteger sua sensibilidade frente a esse mundo cruel. Eu, com meus desastres sem salvação, embora ele tivesse se esforçado (bastante) pra me tirar dessa. Na fila do correio, o assistia falando no telefone. Era o sorriso que antes vinha pra mim. Na hora percebi que já existia outra pessoa. A fila andava lentamente e eu passava o tempo contando os cigarros e os sorrisos-olhando-pra-cima dele. O moço dos correios, encantado com minha gentileza e sorriso ao pedir informação, me assistia enquanto eu assistia o outro enquanto as trabalhadoras do correio assistiam o relógio ansiosas para fechar. Tentava buscar o que me fez gostar dele outrora. Lembrava de momentos alegres que passamos, de nossas trocas afobadas de carinho e conhecimento. Pensei quanto tempo havia passado. Por um instante me senti sozinha, como uma velha que envelheceu sem gatos ao redor. Quis reconquistá-lo, só para não deixar ele feliz com outra e eu feliz sozinha.

- - -

Eu não presto.


Bilhete Único para Amsterdam


O preâmbulo entre o segundo e o terceiro capítulo dessa história é aquela porta que entrei do teu mundo. Teu mundo de plástico e paredes muito brancas e luzes muito claras e espaço muito apertado com pessoas muito estranhas. Gente olhando com cara de quem-são-vocês. E pareceu claro - não há sentido nessa história.

- O que é meu mundo? - Pergunta, dias depois, e em um primeiro momento penso que está curioso para saber a forma como te entendo, mas relembrando talvez seja um súbito desespero teu que bateu e a possibilidade de uma resposta sobre quem é você, que mundo é teu. Seria eu quem saberia?


Passa dois dias e uma estrada e surge um convite. De repente é isso: somos nós outra vez. Esse nós que é tão recente, tão incerto e certo. Aumenta a sensação de que te querer é algo inevitável. Quero te ver e te querer em diversos cenários, e testar outros sorrisos ao teu lado. E se minto para dizer que é meu caminho, não é incômodo algum mudar a rota - pelo menos vez ou outra - pra ter um abraço teu. Podemos ir até um Amsterdam - posso dizer que é caminho para uma reunião inadiável. Tomaríamos um café e eu fingiria não estar atrasada, mesmo que isso envolvesse um efeito dominó do cão pro resto do dia..

Hoje te gosto o suficiente para me satisfazer com um suco e uma companhia até o metrô. Esse nosso suco experimentado em diversas paisagens, acompanhado do canudo que nos entretém quando ficamos sem graça. Te gosto o suficiente para que tuas falas - rápidas histórias com algumas frases interessantes no meio - fiquem sendo revisitadas na memória, buscando sinais, explicações e até simples boas lembranças. Teu sorriso. Teu olhar... tua mão que tentou tocar na minha, ou esbarrou, já nem sei.

Teu bilhete único, pra onde leva? Cada dia parece que não é pra um lugar só, é para vários caminhos, basta escolhermos - e até onde essa escolha existe? Não sei, não sabemos. Coisas que se sabe vivendo.
Foi nítida a tua surpresa quando afirmei que não tinha medo de ti, e tua surpresa me deixou surpresa. Por que teria? Não te ter por perto talvez é o que assuste. - e isso sim é assustador.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Planos e Mapas

Existe um plano: viver um ao outro e outro ao um. Seríamos felizes em Itamaraju ou em qualquer lugar do mapa. Poderíamos brincar de esconde-esconde e pega-pega pelo Brasil e se o dinheiro não for pouco a gente pode até ir pra além das fronteiras tupiniquins - quem sabe um chimarrão em Posadas ou se for possível ousar, um piquenique nos parques de Odessa. Brincar de procurar os começos e fins de todas as estradas de todos os lugares. Fotografias não seriam permitidas - assim, teríamos que nos olhar o tempo inteiro para registrar um ao outro nos mais diferentes cenários.

A gente vai pra Urupema só para eu te dar um beijo no teu nariz gelado debaixo das cobertas escondidos do mundo e de tudo. Depois a gente vai pra Apodi pra tirar toda a roupa do corpo e mergulhar debaixo d´água pra passar o calor.  Comer uma paella em Valência e de sobremesa chocolates de fábrica, na Bruxelas - é caminho, diríamos. Brincar de criminosos se escondendo em uma gruta em Nova Esperança do Sul ou em em meio a uma manifestação com milhares de trabalhadores em Brasilia até que a história seja tão bonita que ninguém ligue que tenha passado por três ou quatro ou mil pecadinhos.

Em nossas mochilas, tudo que se precisa quando não se sabe para onde vai: casacos, guarda-chuva, camisinha, roupa de praia e canivete. Os celulares largaríamos no Rio Acaraú, condição final pra nossa liberdade. Mentiríamos nos hotéis, cada um uma história - éramos primos que fugiram para poderem viver o amor que sentem um pelo outro, ou duas pessoas que se conheceram no ônibus para Alagoas e resolveram viver juntos. Às vezes fingíamos que éramos irmãos e assustávamos o moço do hotel com os barulhos do quarto durante a noite.

Em cima de um mapa gigante aonde marcaríamos todas as nossas cidades já percorridas e traçaríamos nossos futuros planos, tua boca me engoliria  minhas pernas te prenderiam e nossos corpos se fundiriam.  Nossos olhos fechariam pra esse salto seguido de mergulho digno de olimpíadas em Londres. A fuga de dois tempos que se encontraram: meu passado curto e teu passo apressado que corre tentando escapar desse amor gostoso. Entre o teu passado e meu futuro, um presente cheio de carinho. Não adianta fugir, que nosso presente juntos já está agendado até a próxima promessa de fim do mundo. Nos perderíamos no tempo e no espaço dentro de um hotelzinho chinfrim de uma estrada qualquer pra qualquer lugar.

E se não for esse o plano, eu cato a minha mala conhecida popularmente como casco e sigo meu caminho, fazendo outra rota. Amasso o mapa e engulo os planos deixando entalados no peito pra sempre. Largo de vez essa comédia melo-dramática caliente e viro personagem de romance colorido de autor que gosta de histórias seguras que certamente renderão best-seller. Meu par será bonito e bacana, tendo até seus momentos de notável inteligência. Muito mais perfeitinho que tu, com jeito de bom moço e do tipo que apresenta pros pais. Fará citações em momentos interessantes e farão os olhinhos alheios brilharem - que lindo casal! - Se a grana der, faremos uma viagem pacote CVC no fim do ano, pra ter fotos bonitas de preencher paredes brancas. Ele fará muita coisa por mim, só não fará o coração ir pra boca e as pernas tremerem como tu faz.

domingo, 18 de novembro de 2012

Cinco anos.

Era mais uma tarde qualquer de um dia qualquer e eu estava fazendo algo qualquer e ela me chamou para fazer outra coisa qualquer e eu fui com aquela cara qualquer de tanto faz, como tanto fazia qualquer coisa naquela época. Era fim de semana e coisa alguma me aguardava porque eu não tinha muita paciência para as coisas que tinha.

Entrávamos no carro e ela perguntou:
- Por que você não tem amigas, heim?

Não soube responder. Eu fiquei triste. Não sabia porque não tinha amigas, ou amigos. Não sentia falta, na maior parte das vezes também. Ela fazia perguntas difíceis que eu não sabia responder. Também fazia afirmações que eu não concordava, embora tivesse que me esforçar para dizer o porquê. Eu nunca soube entender o que sentia por ela, talvez porque sequer tivesse a entendido. Uma mistura de reacionária com toques progressistas e um bucado de carinho com casca de pequenas agressividades no formato de palavras e expressões.

Anos depois se passaram e eu tive faculdade-casa-emprego-amigos-amigas-namorados-viagens-outra casa-outro emprego-outros amigos-algumas outras amigas-uns tantos outros namorados-músicas-sábados-lágrimas. Tanta coisa passou desde então e nesse tempo todo nunca houve intenção ou se quer desejo de a tornar santa. De um dia para o outro esgotar suas contradições que não era poucas. Não sei dizer se era legal, se era chata. Tenho dúvidas até se é possível dizer se gostava dela ou não. Acho que na síntese de tudo, sim. Tua autenticidade sempre foi digna de meu respeito. Não interessa se era engraçado, se era bobo, se era ruim, se provocaria caretas tortas ou sorrisos largos: o que tinha para falar ela falava. No duro. Com ela aprendi a apreciar a sinceridade, também sabendo a dor que isso às vezes causava - em si e nos outros.

Fato é que temos muitas coisas em comum, para além da insônia que tantas vezes compartilhamos, quando divulgávamos no almoço uma pra outra a quantidade de horas de sono dormidas na noite anterior. Isso não é fácil admitir quando por um tempo meu maior pavor foi me tornar quem era ela. Hoje parece algo tão distante: segui meu caminho, e por mais clichê que isso seja, talvez algo imensamente sem sentido de se dizer - sobretudo para uma materialista - mas sei que se de alguma forma soubesse como estou hoje, certamente reservaria muito orgulho do que me tornei.

Difícil foi vê-la indo embora, tão lentamente. A vida roubou aquilo que tinha de mais precioso, tua vitalidade. E quando foi, houve lágrimas mas houve muito alivio também. Vê-la sem vida no rosto, sem riso na boca, sem suas palavras duras e certeiras - às vezes equivocadas, mas jamais admitidas por ti ou por mim... vê-la indiferente à vida era algo insuportável! E que passe o tempo que for, a lembrança dela viva é presente em cada centímetro da minha vida.

E vez ou outra eu penso que se me visse agora, talvez não me reconhecesse. Ou talvez visse que tudo que eu precisava era ter um lugar e um momento para mostrar quem eu era, e que quem eu era era mais parecido com ela do que ela pensava - do que eu mesma pensava. Autêntica, viva e com insônia. Entre outras coisas. És aquela que eu tenho como referência de quem quero e quem não quero ser. E que deixa bater uma saudade danada, sobretudo no mês de novembro, que vem forte a lembrança da dura despedida e o último carinho na tua mão gelada. A cena que todo ano retorna a memória, onde ainda é presente a dor sentida com a constatação de um pulso que não pulsava mais.

sábado, 17 de novembro de 2012

Amor Grand Hotel.


O dia a tarde e a noite intensa, trabalho trabalho e trabalho. Cansaço bate forte no corpo que dói todo, os olhos pesam para as costas que berram pras pernas que reclamam pro pé que diz chega.

É uma exaustão que domina todos os sentidos até que, no meio de tudo você aparece e tira o desassossego para botar outro. Com todo aquele sono que toma conta, ainda há tempo para, ao fim dos dias, os olhos notarem o hotel – nosso hotel – ao passar. O grande mar azul ficou sem graça perto daquela lembrança que é possível ter ao olhar pro lado do que até então era mais um prédio grande cinza que tampa a vista, e de repente, de um dia para o outro virou o hotel – nosso hotel. Uma das poucas coisas que se pode dizer que é nossa. Que o futuro não permita que haja nós, que essa lembrança seja permitida ser nossa. Os olhos notam e o sorriso abre como um gesto involuntário.

Foi tanta correria esses dias que nem me dei conta que já fazia alguns dias que não pensava em você. Daí a lembrança veio sem bater na porta e pedir licença e desmoronou os muros, entrou sem pudor algum. Assaltou sorrisos. Volto mais feliz pra casa. É hora de dormir. Momento em que te encontrar é permitido (nos sonhos) ainda que indesejável. Fazer loucuras do tipo prometer o sol se hoje o sol sair e chuva se a chuva cair - bem no estilo Geraldo Azevedo mesmo. Porque é sonho e nesses sonhos tem carinho e coisas doces e cantigas de "se você vier pro que der e vier comigo...". 

Ainda que sem querer, eu sonho. E acordo sorrindo, até começar...
...O dia a tarde e a noite intensa, trabalho trabalho e trabalho. Cansaço bate forte no corpo que dói todo, os olhos pesam para as costas que berram pras pernas que reclamam pro pé que diz chega.

É outro dia.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

De que geração nós vamos ser?


"Adelante corazón, sin miedo a la derrota,
durar, no es estar vivo corazón, vivir es otra cosa."
Mercedes Sosa


Um ano depois que eu nasci, declararam o "fim da história". Eu não sabia disso quando comecei a ver que algo havia de errado no mundo. Não passou nem dez anos e fizeram a novela "Fim do Mundo". Eu acho que naquela época já via que tinha um ou duas, talvez várias, coisas fora do lugar. Foi só na Universidade que tentaram me explicar sobre o tal "fim da história". Esquisito. Tentaram fazer o mesmo com a "classe trabalhadora", com "esquerda e direita" e tantas outras coisas.

Eu sou dessa geração que teve só com sorte a oportunidade de ver um grupo de mil pessoas reunidas por um motivo comum que não envolvesse algo de religioso, futebolístico, uma atração cultural ou algo sendo distribuído de graça - ou seja: pouquíssimas ou nulas experiências em grandes manifestações, assembleias, greves, coisa do tipo. Sou daquela geração que, dos poucos que viram mil ou mais reunidos por um motivo comum, alguns dias depois - e às vezes no mesmo dia - aquele grupo já havia se tornado mil e dois.

Eu sou dessa geração que aquilo que sabe dos movimentos de massa é a partir das falas e de livros e documentos e filmes produzidos por outra geração. Eles - da outra geração - dizem que essa coisa, de movimentos de massa, de classe trabalhadora organizada, existe e eu acredito (acreditar não é a palavra correta, pensando bem. não é pela crença, não é pelo credo, pela fé. eu fui convencida de que é isso, ou não será, a possibilidade de acertar as tais coisas fora do lugar, que com o tempo fui entendendo melhor do que se tratava, e essa coisa de gostar de fim do mundo nunca foi lá meu tipo).

Dessa outra geração, uma boa parte hoje foi para outro lado - da parte daqueles que dizem "isso não dá em nada, menina!". Uns esconderam dinheiro do povo na cueca. Uns viraram reitores e foram até pra Disney, com dinheiro do povo. Teve aqueles que só se renderam a burocracia, e vivem num conforto sentindo que "na medida do possível estão fazendo a sua parte". Parte ainda conta entusiasmada, um tanto saudosista, dos bons tempos, como se isso só fosse coisa do passado. Essa gente gosta de dizer que a minha geração tá perdida. Mas tem uma parte, essa que me interessa muito, dessas outras gerações, que continua firme e forte, lutando ombro a ombro conosco, e com uma paciência revolucionária para transmitir todo o acúmulo que tem para essa geração - a minha - que viu a classe mais se dividindo que unida, aos milhares.

Da infância, eu sou dessa geração que pegou a transição: dos brinquedos de madeira aos eletrônicos. Da rua para o apartamento. Do atari para o playstation. Dos botões - aqueles de jogar futebol - aos botões - aqueles da máquina digital e tantos outros aparelhos. E desde ontem, o tal 14N (primeira greve geral do século XXI ocorrido em quatro países da Europa, e mobilização em cerca de 23 países), passei a ter mais confiança que posso ser da geração que pegou a transição de um período sombrio para um possível ressurgimento de grandes lutas das massas.

E quem sabe, daqui a uns anos, eu poderei dizer que eu fui da geração que definitivamente calou Fukuyama e tantos outros sociólogos, psicólogos, antropólogos e sei lá o que mais, que se apressaram em enterrar aquilo que jamais morrerá - a história. Que quiseram calar aquilo que é impossível de ser calado. Porque faz umas boas centenas de anos que tem um espectro que ronda a Europa - e todo o mundo - e este não sossegará, passe por quantas gerações tiver que passar.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

cum panis.

aquele pra ligar de madrugada mesmo que não vá dizer nada de útil. pra conversar. e ele agir como se não houvesse nada de estranho.
...
- e aí, tudo bem?
- sei lá. tive um pesadelo.
- hmm...
- e você?
- eu estou bem. que foi seu pesadelo?
...

aquele que sobreviveu aos tornados. nós sobrevivemos. apesar de tanto grito, tanta lágrima, tantos dias que pareciam que de nós só restariam ruínas, eis que demos um golpe da história e aqui está: hoje existe um "nós". amorfo, inexplicável em alguns momentos, com algumas cicatrizes delicadas de serem cutucadas, mas existe. não poderia ser diferente.

há uns bons anos atrás, nos perguntávamos porquê lutamos, enquanto andávamos pela rua a caminho de algum lugar. foi você foi quem me tirou da resposta automática "socialismo" ou "fim do capitalismo" e me fez pensar pelo que de fato lutamos: um mundo em que as pessoas possam ser sinceras. tempo de amar. tempo de viver. um mundo que tenha outro tempo. por mais bobo que isso seja  - e você me ensinou a me permitir ser boba, vez ou outra - você me ensinou a sonhar. ou: foi contigo que vi que sonhar é permitido, e mais que isso, é necessário. bem como é nosso dever batalhar por eles.

e nesse sentido de lutar e sonhar, há tempos atrás aprendemos a como construir isso juntos, e fizemos a doce escolha de sermos companheiros. companheiro. do latim cum panis. aquele com quem dividimos o pão e confiamos o suficiente para sentar conosco na mesa e dividir nossas ideias, vitórias, derrotas. é uma das palavras mais lindas que conheço e gosto de te chamar assim.

pois contigo divido o pão, as incertezas, e as poucas certezas também. você é aquele que sei-que-sempre-posso-contar. que me tira de apuros - e vez ou outra me bota em alguns também.

do tipo que me inspira, quando tudo parece sombrio e entediante, a seguir firme.
nem que às vezes precise de um empurrãozinho.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Do ato de tirar e botar os pés no chão.

"Me abraça, me aperta, me prende em tuas pernas
Me prende, me força, me roda, me encanta

Me enfeita num beijo"

Todo fim é um novo começo. Assim aprendera a olhar a vida. Daí partia do contexto optar pela perspectiva que melhor coubesse. Mas e quando aquele fim parece não ter sido fim? O ponto final que olhamos de perto e percebemos, então, que era uma vírgula. Pausa para o texto que segue, na mesma frase, sem sequer um parágrafo indicando que o tom mudou. Pra começar, como chamar de final a interrupção de algo que não aconteceu? E se aquele começo sequer ter sido  o começo? Talvez um prefácio de uma boa história - e caberia a nós definir se seria romance, ficção científica, diversos contos fragmentados... ou apenas mais um prefácio pós-moderno nietzscheano (que escreveu cinco prefácios para cinco livros não escritos).

Independente disso tudo, havia uma decisão: deixar-pra-lá. E qual foi a surpresa quando você assalta o pensamento por quase todo o fim de semana - no quarto, na casa, no filme, na praia, no banho, no carro, na música, no sonho -, como uma pessoa de regime que assalta a geladeira de madrugada, com a ideia de que "se ninguém vê não é crime".

Cogitei de fato ser uma loucura minha, insistir nisso que a cada dia parece virar fantasia. Calculei o ciclo menstrual para saber a influência dos hormônios naquela insistência. Considerei talvez estar gostando do gostar de você, de na verdade ter me apaixonado por uma história, e não por uma pessoa.

Pode ser a loucura. Pode ser os hormônios. Pode ser até a paixão pela história e pelo gostar. Mas é real, e de tão frequente passou a não ser tão absurdo. Ao passo que de ser tão imaterial, dia após dia começa a virar fantasia. Pouco a pouco fui me acostumando com teus assaltos, com a gostosa assombração que você se tornou. E assim, não soou tanta loucura aparecer na tua frente sem compromisso e ensaiar um outro começo, para saber se a história ainda assim seria apaixonante, se o gostar ainda assim seria gostoso, e se você ainda assim me assaltaria o pensamento. Temo achar que sim.

E sabe, por mais que eu saiba que não é a primeira vez que acontece, sei também que não é algo do tipo que acontece todo dia. E se existem sentimentos e falas e cenas que lembram sentimentos e falas e cenas de outrora, não torna menos importante esse momento e essa história. Principalmente quando, ao lembrar de que momentos esses sentimentos, falas e cenas foram parecidos com os que existem hoje, foram de fato bons momentos de vidas-em-relação vividas de forma intensa, e que foram muito bacanas e não significaram derrotas pelo fato de terem acabado. Tiveram o tempo que tiveram.

Mas voltando da fantasia e botando os pés no chão, é certo que essa carta jamais será enviada ou esses pensamentos jamais serão confessados.  Não por covardia. Não tenho medo de parecer boba e até de parecer louca, pois se viver de forma intensa e ser sincera com os sentimentos que vem, prefiro ser vista como boba ou como louca, até encontrar alguém que não veja as coisas dessa forma, e que assuma que paixão não vem comedida e então não tem porque existir cordialidades e disfarçar a urgência que é querer estar perto de quem se quer estar perto. Mas não é disso que se trata essa história. Coragem para dizer, existe. Creio até que, de certa forma, em linhas e entrelinhas já foram ditas, em momentos em que foi incontrolável não-dizer. Mas não serão repetidos, e não por covardia. São fatores pra-além-de, que esses sim são novidades e que serão fatores acatados, de forma tal que a possibilidade de dar o salto e ver-onde-isso-pode-dar será interditado e invadido por um silêncio de palavras-que-jamais-serão-ditas-pela-minha-boca e olhares-que-nunca-mais-confessarão-promessas.

E isso não tornará essa história mais bonita - pois contos-de-fada ou romances dramáticos e platônicos nunca foram mesmo meu tipo. Sequer menos bonita - pois para mim vidas-em-relação não são medidas por finais felizes, mas sim pela forma sincera e significativa que foi possível fazer seu caminho. Isso só torna essa história uma nova história, que apesar de lembrar sentimentos e falas e cenas de outrora, é uma outra bela história, com suas nuances e atrações características.


segunda-feira, 12 de novembro de 2012

E aí, quer dizer que está feliz em Natal?

"O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim:
esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem."
Guimarães Rosa

Da experiência de vir para o Nordeste, tenho ouvido muito as pessoas falarem de como é incrível "abdicar de toda sua vida para ir para outro Estado, assumir uma tarefa como essa". Alguns dizem "não conseguiria fazer isso". Acontece que eu não deixei "a vida" para trás. A minha vida veio comigo e a minha mala, para essa nova terra pra chamar de minha. 

As coisas vão acontecendo e nem sempre se trata de fugir de algo ou de buscar algo específico, mas afirmar  os caminhos que se trilham. Isso não significa que seja algo "passivo", que algo do além nos oferece coisas e vamos dizendo "sim". Pelo contrário: somos ativos nesse percurso e a afirmação é algo que nos demanda refletir e afirmar. Mas é algo para-além-do-eu - minha vida, minha carreira, meu romance, minha família. 

E existe a saudade - e como ela existe. Viajar e ficar longe daquilo que entendia-se como nosso "habitat", é também re-conhecer: a antiga casa, a cidade, amigas e amigos, família. Descubro a cada dia uma saudade nova, de coisas que sequer imaginava que sentiria falta. Entendo melhor como fui me tornando o que sou quando percebo que determinada forma de agir era porque estava naquele lugar, com aquelas pessoas. Ficar esse tempo longe me fez revisitar a minha infância, perceber momentos determinantes que me trouxeram para onde estou hoje. Também me vejo lembrando de pessoas que estavam no dia a dia e que só agora longe penso como eram - são - importantes. E claro, penso nas pessoas que gosto muito e o carinho só aumenta. Confesso que muitas vezes a saudade não é constante. A saudade vem em ondas, em momentos de maré alta e maré baixa. E vez ou outra vem uma onda forte de um sentimento forte e honesto, ao olhar uma foto ou um video, que lava os olhos de lágrimas, de forma involuntária. 

Sair do lugar-comum é também se confrontar com coisas novas, que te empurram para novas respostas e novas perguntas também. Conhecer novos cheiros, sabores, paisagens. Encontrar pessoas novas e estabelecer novos vínculos de confiança. Novamente me pego procurando quem seria aquela pessoa que sentiria a minha falta caso algo acontecesse comigo. Ou: quem procurar quando a saudade bate e ficar sozinha em casa torna-se insuportável? Aprender novos mapas, e de repente se ver andando confiante por um caminho que há pouco tempo atrás era estranho.

Além disso, é notável como esse sentimento de "estrangeira", retomado constantemente principalmente no confronto de sotaques e gírias típicas, vem também com uma relativa rápida adaptação, que em pouco tempo me levou a me ver também como natalense-potiguar. Talvez seja coisa da construção do socialismo: somos paulistas, cariocas, santistas, europeus, africanos, guarani-kaiowás. Somos internacionalistas, quando o mundo nos chama - e ele chama, e nós vamos. Talvez por isso seja tão difícil falar em "voltar", como se existisse um lar-pra-chamar-de-meu. De repente, somos tomados por essa sensação de sermos do mundo. 

Estou aqui, e é isso, por enquanto. Constantemente, os amigos e amigas queridos me perguntam:
"Você está feliz em Natal, né?" - alguns afirmam, constatando; outros de fato questionam, preocupados. É pergunta difícil de responder. Nunca soube afirmar com segurança de que sou feliz - e isso não significa que não seja, mas porque acho que isso é uma pergunta-sem-saída mesmo. Talvez porque afirmar "sim, estou feliz", dá um ar de "final". Sinto que as pessoas vêem a felicidade como um estado estático. Pra mim, felicidade é caminho vivo. É quando estamos fazendo as coisas, e encarando os desafios. Felicidade é quando existe movimento. Isso não significa que as coisas estejam fáceis, ou simples, e que não envolva momentos duros, que nos provoquem angústia danada. Mas é quando, mesmo na euforia, olhando pelo vidro da janela do ônibus ouvindo uma música que gosta enquanto corremos para algum lugar que possivelmente estamos atrasados, respiramos e pensamos: estou bem. E um sorriso nos assalta no rosto. 

Pois, feito as considerações, afirmo: sim, estou bem, estou feliz. 

domingo, 11 de novembro de 2012

Uma carta de amor

Sabe que escrever para você é difícil porque os pensamentos sobre você vem em bandos e alguns até vem num nó difícil de desatar e em códigos talvez difíceis de decifrar e é difícil conseguir capturar de forma organizada. Creio que alguns vem até com aquelas letras de médico, ilegíveis. Você traz um excesso de informação e eu queria muito te falar tanta coisa mas eu não sei fazer isso.

Sabe que há um tempo eu reparei que quanto mais acelerada eu tô pra dentro, mais lenta eu me apresento pra fora. E as pessoas frequentemente vem dizer que eu passo um olhar de calma, e eu fico pensando se um dia elas conseguiriam ver o caos que é dentro de mim e quanta bagunça tem aqui dentro e o turbilhão de coisas que vem por segundo. E você fala para mim umas coisas que me trazem tantas coisas que eu penso que um dia vou conseguir escrever ou dizer. Na minha cabeça acontece como naquelas cenas de filme em que tem uma cena parada e de repente acontece alguma coisa, às vezes absurda, e depois retoma a cena parada e então você percebe que a personagem estava apenas imaginando. Na minha cabeça quando você tá falando comigo eu imagino eu interrompendo e botando a mão no teu ombro e dizendo “Você quer saber mesmo o que se passa?” e então eu inicio uma fala de 40 a 50 minutos soltando tudo que se passa na minha cabeça. Mas fica só na cabeça porque na realidade sou eu olhando pra um ponto que não é seus olhos, ou mexendo num canudo ou num guardanapo ou qualquer atividade banal que parece ser levada com tamanha seriedade – qualquer desculpa para não botar a mão no teu ombro e falar por 40 a 50 minutos.

Sabe que eu penso muito tentando entender as coisas e às vezes acho que é esse meu problema. Às vezes eu quero falar das coisas que penso mas penso também que falar das coisas que penso é o que estragou tantas relações. Eu queria que você entendesse que às vezes eu me sinto como aquele “encarregado” que fica numa situação chata entre os trabalhadores por ter que passar as más notícias do patrão. Eu queria que as coisas fossem de outro jeito, mas eu apenas te repasso coisas que sinto que não tenho muito controle, e que simplesmente é como estou me sentindo. E nesses contextos de tamanha fragilidade eu tenho andado num imobilismo absurdo que tem me incomodado demais. Eu queria tentar te explicar e talvez explicar até pra mim mesma o que se passa mas tem horas que eu acho desnecessário e tem horas que eu acho que nem eu mesma sei do que se trata mesmo a explicação que eu queria dar. 

Sabe que eu me pego várias vezes fazendo planos. Eu tenho apostado cada vez mais que talvez o caminho seja abrir mão desse monte de coisa e tentar simplesmente viver e “ser” com você. Pelo menos tentar. Apostar. Só que como já te disse, até minhas apostas e impulsos são planejados então talvez esse encaminhamento leve um tempo – e eu não te peço pra esperar, não é disso que se trata tudo isso. Mas eu queria que você entendesse que é muita coisa que se passa e de fato tem coisa que tem a ver comigo e minha enrolação pra tudo e as bagunças mas tem coisa que é essa vida doida que nos chama e nos tira a possibilidade de pensar, viver, respirar o amor.

Sabe que eu sei que você tem prazo de validade e qualquer hora você vai encher das minhas complicações e confusões e bagunças. Creio que hoje, apesar dos momentos que fica bravo, ainda consegue ver certo charme mas sei que se eu não mudar logo você logo se cansa e aí já era. E isso me apavora um pouco. Eu espero ajustar as coisas antes de você cansar, mas sabe que tem coisa que eu acho que é meio fora do meu controle. Hoje eu ouvi a Adriana Calcanhoto e ela cantava “eu não moro mais em mim”. Eu sinto que eu tô meio de aluguel nesse meu corpo e que não tenho tido muita autonomia pra decidir certas coisas. É um momento bem atípico da minha vida que eu espero que passe logo. E que quando passar, que você permaneça.

sábado, 10 de novembro de 2012

Do início do fim.

- Me diz! Vai, me diz!


(silêncio)


- Eu não sei.

(silêncio)

- Porra! Diz, diz pra mim!
- Eu... eu não sei, porra! Não sei!
- Porra! Você de novo dizendo isso! Não é possível que você não saiba.
- Se eu soubesse te diria, mas não sei!


(silêncio)


- Não é possível. Me responde! Diz, diz o que você quer?
.
.
(silêncio)
.
.
...O que você quer de mim?

(...)

Era sempre a mesma pergunta. Busted. Sempre colocada contra a parede com a boa e velha pergunta: o que ela quer, afinal? Não sabe, responde. E de fato, não sabia.

E sabia que seu não saber não se resolveria lendo três ou quatro bons livros, como se isso bastasse para entender e ter respostas.

Sabia que o que importava não estava na pergunta “o que quer?”, ou na sua resposta "não sei". Era algo de seu comportamento, suas ações, suas escolhas nas diferentes vidas-em-relação que levavam a repetição da maldita cena com a mesma pergunta: o que você quer? 


Então era mais um fim que começava de novo. Mais um adeus sem saber porquê, e era justamente porque não sabia que o adeus vinha sem saber porquê. 

Mais um dia que anteciparia longos dias...




sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Nossa voz não será estuprada.

Duas notícias me tomaram o dia, e que muito dialogam entre si. Por um lado, o Estatuto do Nascituro, projeto de lei que tramita atualmente na Câmara dos Deputados (para conhecer o projeto clique aqui, e para ver um pouco do porquê é tão grotesco, veja uma boa leitura clicando aqui). Por outro lado, (mais) um caso noticiado de estupro seguido de assassinato de uma mulher (para ver, clique aqui). Ela, Josy Ramos, era professora Universitária, e voltava para sua casa quando foi estuprada e, em seguida, estrangulada.

Um caso horrível, não? O senso comum pedirá para a justiça procurar e punir o monstro que fez isso. Outros, mais reacionários explícitos, irão dizer: "vai saber com quem ela estava andando..." ou "ela devia estar metida com algum safado, ninguém é violentada assim gratuitamente". Deixemos de lado os reacionários, que esses não merecem sequer um comentário. São casos perdidos. Do senso comum, que procura avidamente por um culpado - ou, responsável - eu digo: o Estado. A mídia. A Igreja. E em certa medida, nós, se nos mantermos calados perante tudo isso. Claro, todos em suas devidas proporções.

Casos como o de Josy Ramos acontecem todos os dias. Muitos casos não são noticiados na mídia, não são discutidos sequer entre a família e os amigos da vítima - inclusive e talvez principalmente em casos que o estuprador é parte da família ou dos "amigos". São casos silenciados e abafados. Tentam não falar, pois é constrangedor. É difícil. E nós achamos difícil mesmo, mas é justamente por isso que nós tentamos fazer o oposto: falar sobre.

Todas nós somos, em diferentes medidas, Josy Ramos. Somos violentadas cotidianamente pela mídia que nos trata como objeto; pela Igreja que nos orienta a ser boa mãe e boa mulher; pelo Estado que não nos garante nossos direitos e segurança (e ainda nos criminaliza quando agimos com autonomia perante nossos corpos e vidas); pelos homens que, direta ou indiretamente, tentam nos ordenar: fiquem em casa, andem sempre com alguém, veja como se veste... ou te estupro, estrangulo, te mato. E nós, em certa proporção, somos responsáveis quando reproduzimos o silêncio e deixamos que matem mais e mais nossas companheiras.

Nos acostumamos a não nos revoltar ou sequer se indignar pelo fato de viver em uma sociedade que nos impõe ser mãe sem nos dar o mínimo de assistência para tal. De ser uma boa esposa, mesmo quando nosso marido nos agride - algo fizemos de errado, para isso, não?. Nos habituamos a uma mídia que nos diz como devemos nos vestir, nos comportar, quanto devemos pesar, como devemos ser caso desejemos ser "bem comidas". Devemos organizar as nossas vidas para sermos "bem comida". E a sociedade, com todo o apoio da mídia, nos impõe ser "bem comidas", pois caso contrário somos ressentidas e não sabemos viver - aliás, as feias que agradeçam aos estupradores, já dizia o infeliz Rafinha Bastos. Nos habituamos ao "toque de recolher" que para nós, mulheres, é cotidiano, caso não queiramos "dar motivo" para sermos estupradas e estranguladas. E se somos obrigadas a ultrapassar esse horário, porque trabalhamos ou estudamos ou simplesmente queremos nos divertir, temos que nos habituar a andar com medo por ruas escuras e abandonadas, pois o Estado não é capaz de (não quer!!!!) nos prover segurança.




Tentam estrangular nossas vidas de várias formas, todos os dias, ao nos reduzir a meras reprodutoras ou meras "boas esposas". E o Estatuto do Nascituro é mais um exemplo disso. E eu não vou nem entrar aqui em questão se as células embrionárias são uma vida ou não. Acho que vale as pessoas procurarem artigos de companheiras que destacaram muito bem as consequências desse projeto. Aqui, destaco alguns absurdos apenas: o fato de que não será mais permitido a realização de aborto quando em casos de risco na gravidez ou em casos de estupro. Assim, se uma mulher corre risco de vida, ainda assim buscará salvar o feto. E, em caso de estupro, a mulher deve permanecer com o filho - isso levando em consideração que muitos estupros envolvem casos de pedofilia, de jovens mulheres que são assediadas por familiares e vizinhos e serão crianças obrigadas a gerar criança. E mais, o aborto espontâneo (cuja probabilidade é de 25% das gestantes no início da gravidez) será investigado como caso de polícia.

Absurdos à parte, o que ressalto aqui é: esse mundo, não é pra nós, mulheres. Esse mundo não é para nós e para nossos companheiros, tampouco. Somos nós que fazemos esse mundo, e então seus atuais donos nos retornam com migalhas de tudo aquilo que nós fizemos, nos viram as costas, nos fecham as portas, e ainda nos dizem: calem-se. E isso não significa que nós nos nos calamos, ou sequer calaremos.

O que eles não sabem, os tais "defensores da vida" - também conhecidos como defensores da moral e do bom costume - , é que nossas vidas não são estranguláveis. Quando alguma Josy Ramos é estuprada, ou assassinada, ninguém verá esses "defensores da vida" que defendem o Estatuto do Nascituro em defesa de sua vida, encerrada de forma tão violenta pelo machismo que mata todos os dias. Podem ter certeza que vocês não verão. Mas, quando alguma Josy Ramos é estuprada, ou assassinada, podem ter certeza que são mais duas ou três, ao menos, "Josy Ramos", que passam a se indignar. As indignações existem - eu sei que existem - mas precisam ser transformadas em voz e ação. Urgente.

O nosso feminismo vem da luta pela emancipação humana, é a luta pelo fim de toda e qualquer forma de opressão. E quando formos milhares, ombro a ombro, lado a lado, homens e mulheres na luta pela liberdade, teremos força para tomar esse mundo que é nosso, esse mundo que nós fazemos com nossas mãos e assim, nossas vidas serão livres. Essa é a nossa luta: minha e tua que lê agora, e que por isso solicito e convoco para não que não permita que matem mais uma companheira nossa.
 
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