quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Você me faz fazer frases curtas.

Você me faz fazer frases curtas.
Rápidas.
Como um twitter.
Talvez seja coisa dos tempos modernos.
Talvez porque esteja (estamos) sempre com pressa, sempre de passagem.
Somos vinheta.

- O que tem hoje?
- Não vou.
- Eu tô por aqui.
- Eu vou acolá.
- Não te vi.

Perguntas que não levam a lugar algum, ou ao menos algum lugar que nos seja de interesse. É que interessa teu caminho em minha direção, meu caminho em tua. Mas estamos sempre com pressa para outros rumos, outros sambas, outros bares, outros corpos e histórias. E os passos teus pros meus, esses são lentos, caminham meio bêbados, alegres, como se não houvesse hora pra chegar. Vivemos esse romance desigual e combinado: ritmo do século passado com toques de era moderna. O tempo é curto e as frases são curtas pra manter a concentração, como hoje se exige. Logo você se distrai com teu almoço, e eu com uma reunião.

Você me faz fazer frases curtas e assim eu aprendi até a fazer poesia.
Brincadeiras.
Pra te chamar a atenção.
Ainda que seja em vão.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Internacionalismo

A cidade de repente ficou pequena, e veio outra.
Daí eram duas cidades, que também ficaram pequenas.
E vieram outras... pequena demais.
Então mudou o Estado, e teve outro e outro e outro.
E o Brasil ficou pequeno.
Então veio outro País... pequeno, pequeno País.

Na semana passada, o mundo todo coube num salão.
O mundo ficou pequeno, e coube naquele salão.
Falávamos muitas línguas e ainda assim nos entendíamos.
Pois todos queriam se escutar,
E contar do que sabiam
E perguntar o que queriam saber.

Hoje o mundo ficou grande.
Todos estão longe
uns dos outros.
Cada um no seu canto do mundo
lutando para que o mundo fique pequeno de vez.
Pra sempre.


domingo, 20 de janeiro de 2013

Mais um morto.

O jornal denuncia
a morte de mais um companheiro.
Eu não o conhecia,
mas lutamos pelas mesmas causas.

O atestado de óbito
está escancarado no jornal
ainda que poucos leram:
Mais um morto pela causa.

Eles sabem que
não adianta matar
um ou milhares:
A causa permanecerá.

Não há arma que mate
a indignação diante da injustiça.
Porque cada um assassinado
são um ou milhares que se revoltam.

Ainda assim eles matam
Porque tem ódio
Porque tem medo

Mas a causa sobrevive
Porque nós temos razão.

*em homenagem a André Caruaru (PSOL-PA) e tantos outros...

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

poema no. 334

(por Mauricio de Oliveira Filho)

diz alexandra kolontai
(uma poeta russa)

- O homem atual não tem tempo para amar -

então é por tanto amar
que me sinto fora do eixo
fora dos trilhos
fora do tempo
fora do mundo
(deste mundo)

um deslocando
um despertencente

é por tanto amar
que quero outro mundo
onde caiba tanto amor

onde caibam eus
onde caibam vocês

eu sei
que neste mundo não cabemos
que neste mundo
onde tudo se compra
onde a existência é mercantil

não cabemos eu e
meu amor
                      eu e você

por isso
hei de mudá-lo
eu e minhas companheiras
eu e meus companheiros
verteremos este mundo

numa terra sem amos
        eu e meus amores

De: http://esbocodeblogqueiaser.blogspot.com.br/2013/01/poema-no-334.html

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

dos riscos de deixar nas entrelinhas.

eu não quis dizer
que se pudesse
eu gostava de você.

e não quis dizer
do medo
das pernas bambas
do frio na barriga

melhor dizer
que é o sexo,
que é sacanagem,
que é passageiro.

e não quis dizer
da saudade
da falta
do amor.

melhor dizer
que não era pra ser,
que foi como foi,
que tanto faz.

e não quis dizer
dos abraços sem jeito
dos olhares intensos
dos toques carregados de desejo.

não quis dizer
que aquilo tudo
era a vida vivida

assim
ao invés de colorir o céu
sujamos um lençol.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

brincadeira

a menina e o menino
quiseram brincar.
mas de tão impossível
que era,
de tão difícil
que estava
se encontrar
a brincadeira mudou,
virou esconde-esconde;
e eles passaram a vida
finita ou infinita
desencontrando o encontro
encontrando o desencontro

nunca se viram.
só se sentiram.
e ainda assim
sorriram, sorriram, sorriram.

sábado, 12 de janeiro de 2013

Mas as pessoas da sala de jantar

A criança observa seus tios, seus avós e seus pais. primos e primas, além de seu irmãozinho menor. A sua família era do jeito que as margarinas gostam: os homens falantes lembravam o pavão que havia visto na televisão dia desses. Imponentes e grandiosos. As mulheres preocupavam-se o tempo inteiro com as vasilhas, se a comida estava certa, se a sobremesa estava encaminhada, se os copos estavam preenchidos. Atentavam-se se as crianças estavam bem.
- Betinho, tira o caminhão da boca do Artur! Ele é neném! - gritava uma delas.

Olhava a tudo e pensava como ali as coisas pareciam tão bem, mas há algumas horas atrás, antes da visita chegar, seu pai gritava com sua mãe, em um volume muito alto. Parecia bravo. A mãe chorava, mas o choro de sua mãe era algo recorrente no dia a dia dela. Já havia se acostumado, e pouco a pouco estava acostumando com os berros do pai também. O que não entendia era a forma como tudo acontecia tão rápido. Um momento estão ali, parecendo se detestar. No outro, agiam como na foto amarelada da estante, do casamento deles. Conhecia aquele sorriso da mãe, um sorriso rígido, diferente de quando ria das atrapalhadas do neném Artur.

Era a hora do jantar e ela já aguardava na mesa, assistindo tudo. Gostava de observar e aprender com sua família como se faz, como se vive, como se fala. Seus irmãos corriam e brincavam. Ela sentava igual mocinha, como a mãe havia ensinado, cuidando para não amassar o vestido. Pouco a pouco as pessoas sentam na grande mesa. Começam a jantar, engolindo as tristezas e pequenos remorsos junto com o bife, arrotando sorrisos e conversa besta. A criança observa tudo em silêncio. Sua tia, tentando envolver a criança no mundo dos adultos, pergunta, diretamente da outra ponta da mesa:

- E então, mocinha, o que vai querer ser quando crescer? Já pensou nisso, ãnh? - Todos aguardam olhando para ela, que tenta rapidamente pensar na "resposta certa" para essa pergunta. Ela examina sua mãe, suas tias, sua avó e responde, com tom de sábia:

- Eu serei mulher de alguém.

A primeira reação da mãe é um susto. Ficou desconcertada, e foi tomada por um mal estar. Foram poucos segundos. Todos olharam para a criança, alguns largaram o garfo. Começam a se olhar, até que a tia começa a soltar uma risada alta.

- Ai, você é uma figura. E você, Bentinho? - Todos relaxam, e agora olham para Bentinho, que diz que será engenheiro, como o pai. Pouco a pouco sorrisos se abrem. O tio bate nos ombros do pai, que parece orgulhoso. A mãe permanece um tempo ainda se recompondo da resposta da filha. Por um instante, reflete sobre quem ela é naquela casa, naquele monte de gente, naquele monte de comida e louça. Lembrou de seus sonhos de quando tinha a idade da filha. Eram grandes. Seus olhos começaram a encher de lágrima, até que.

- Ei, Teresa! Onde está aquele pote verde? Pensei de colocar a sobremesa nele, que acha?

Então, Teresa engole a lágrima e seus sonhos de criança e vai pegar a vasilha verde. Sua filha permanece, sentada igual mocinha. Seus filhos correm, e correm, e correm.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Atravessamos a fronteira.

Atravessamos a fronteira. Do campo entre os extremos previsíveis do clichê - o pudor e o tesão, o romance e a sacanagem, o pavor e a coragem -, havíamos encontrando um canto nosso, só nosso. Você dizia que nós somos (éramos?) um clichê. Eu custei a acreditar. Talvez dizer que éramos um caso a parte atenuaria a nossa culpa (culpa? existe/existia isso?) ou nosso crime (crime? existe/existia isso?). Que seja, agora já foi, deixa pra lá. Atravessamos a fronteira. Ou: tu atravessou e eu atravessei. Não sei até que ponto atravessamos juntos. Éramos nós, e de repente não éramos nós. Tornamo-nos dois estranhos.

Na cama, dois estranhos num elevador. Parece ruim, não é. Surpreendente, talvez. Rápido demais? Ou tarde demais? Havia algo de errado com o tempo, que passava lento e rápido, apressado e atrasado e nossos corpos curiosos e cansados de tanta espera mas ao mesmo tempo tão acostumados e estranhando aquilo tudo. Talvez não era eu. Não era você. Não era nós. Talvez éramos estranhos até para nós mesmos. Aquela cama não se reconhecia naquele espaço. Estranhava aquilo tudo, nos expulsava. Antes do dia seguinte, na hora seguinte, a vida seguia como se nunca tivesse existido um "nós".

Hoje penso: encontros acidentais na rua. Talvez a única forma de te ver. Penso pra quê. Meu interesse por ti não é romântico. Talvez seja pior - mais grave, algo assim -, existia um interesse pelo teu lado humano. E teus ombros não suportaram a nossa história. Preto no branco, certo e errado, fez o que achava que tinha que fazer. O mais aceitável, que curiosamente é o mais desumano. Então foi, da forma mais bruta que tantas vezes temíamos e nos comprometíamos a não fazer. Aliás, nosso único compromisso: não sair dessa forma, da vida um do outro.

Antecipaste a nossa despedida, que estava colocada como possibilidade – se fosse acordado por nós dois que assim seria melhor. Com medo de viver algo novo repetiu velhas histórias, grandes clichês, clássicos modelos de humanidade desumana. Tornou nosso romance sujo, antes tão enfeitado com sucos e canudos e Machado de Assis e tardes em São Paulo e Natal, com toques sutis de submundo, com sua amiga prostituta ou mesmo nossas pequenas aventuras.

Existe uma vontade de reajustar essa história. Não por ti, nem por mim, menos ainda por nós. Algo de acertar as contas com a vida, coisa assim. Enquanto isso, sigo botando concreto e asfalto ou areia do mar no abismo que construiu rapidamente depois desse nosso atravessamento impulsivo. Quem sabe a gente se vê.


sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Do homem que amava demais

Ele nunca está sozinho. Sempre namorando e sempre aparecendo gente nova pra namorar. Apaixona, machuca, apaixona novamente. Muitas histórias que há um tempo deixei de acompanhar. Antes sentava na beirada de um banquinho com um saco de pipocas e ficava a assistir, como num filme, o seu vai-vém pra lá e pra cá e encontra uma e encontra outra e sai com um e não dá certo e dá muito certo e fica feliz, faz um monte de coisa ou se deprime, se tranca em casa.

Hoje são peças de um quebra-cabeça desconhecido. Não assisto mais voluntariamente, mas as informações chegam para mim compulsoriamente, e vivo naquele sentimento ambíguo de querer saber mas não querer saber e conta-não-me-conta, conta aos pouquinhos e não de uma vez só. Mas eu acabo sabendo de todas as histórias. Ou quase todas. Agora que parei para pensar, não sei. Talvez só as mais importantes.

Às vezes me vem a cabeça pensamentos e sentimentos absurdos como "quando será a nossa vez, afinal?", sem deixar de lado que tivemos... tivemos? A sensação que tenho é de que não tivemos. Não tivemos vez. Tivemos algo, isso é fato: intenso, gostoso, dolorido um tanto. É fato que nos amamos. Uma bela história. Mas não tivemos vez. E a nossa briga era essa, sempre. Entre tantas paixões e amores e tesões, envolvido no meio de tantas histórias, com tantos enredos e personagens, ele não consegue dar vez a ninguém. E eu não quis dizer e se dissesse acredito que tampouco ele entenderia que essa vez ele não queria dar nem para ele mesmo.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Falando de mim


Não sei eleger minha banda ou comida favorita. Sequer sei escolher time. Ainda não decidi qual cerveja é a minha preferida. Minha única certeza é ser comunista. E portadora de um diploma de psicologia. Entre coisas básicas como meu nome, idade, RG, nome da mãe e nome do pai, do irmão. Comigo nada é assim, do tipo preto no branco. De resposta bate-pronto: sim ou não. Onde você mora? O que você faz? Tá tudo bem?


E de alguma forma, nesses passos tortos, a vida acontece. Larguei o caminho que estava pronto, catei umas pedrinhas e sigo fazendo o meu, sem concreto e asfalto mesmo - só em alguns trechos. É um labirinto, que de vez em quando tem que voltar quando percebe que pra onde vai não há saídas. Assombrações aparecem o tempo todo e é preciso ter coragem para enfrentá-las. Para isso, precisa reescrever o passado, novos significados, compreender de novo o que ficou pra trás. Os monstros são nossos medos, que reproduzem rapidamente na medida que damos atenção a eles. Guardo os mais divertidos: trovão e palhaço. Tento matar aqueles medos de coisas que são fora de nosso controle. E o que é possível resolver, superar, enfrentar, vou lá e faço, sempre de mãos dadas com outras pessoas. Tenho minhas companheiras e companheiros que me dão muita coragem de fazer, falar qualquer coisa. De ser quem eu quiser. São quem me dão coragem para caminhar. De vez em quando tem que fazer uns caminhos que parecem desnecessários, mas que são importantes, porque nesse labirinto da vida, o objetivo não é chegar apressado no final. O que interessa é o caminho.

E sabe, parando pra pensar um pouco, nesse começo de ano... até que olhando pra trás, meu caminho não está assim, nada mal.



 
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