quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Do amor livre

De nada me interessa tua mente presa em mim. Quero teu corpo livre, e tudo que vem junto: teu cheiro tua fala teu olhar tua língua teu nariz tuas pernas teu queixo tua calma teu beijo tua ternura teu sonho tua barba teu sexo tua alma. Teu corpo livre que vem porque vem - gratuito, bruto e sincero - é uma alegria que não tem nome nem tempo nem tamanho. Tua mente presa em sonhos covardes, por outro lado, não me atrai nem um pouco. E eu sei da prudência com os outros olhares e com os outros compromissos e com a vida que chama pra gente encarar a realidade - e "encarar" é uma palavra forte, porque não se trata de algo compulsório: nós trilhamos caminhos distintos que escolhemos e nos mantemos afirmando e eles nos chamam vez ou outra de nossos devaneios da insistência em manter-em-relação. Eu entendo, entendo tudo e talvez esse entendimento possa ser pretensão dos meus singelos vinte-e-poucos-anos, como pode ser a minha agilidade no pensamento - que tu diagnosticou de forma inédita.

De ti o que me atrai é aquilo que é vivo com cores, um estilo único e uma pitada de humor. Teu esforço de dizer coisas bonitas sem se comprometer ao excesso. Tuas confissões feitas debaixo do cobertor. Teu sonho de ver a lua comigo. Tua promessa de uma fuga que jamais será concretizada. Teu tesão dissimulado. E até essa sua necessidade de se firmar como bom moço, querendo equilibrar com teu lado criminoso que está tão exposto - pela tua profissão e nossa história -, tem seu charme - não vou retirar palavras desse diálogo, sustento meus pensamentos, ainda que sejam equivocados porque não te conheço.

No nosso mundo tem estrela e sol e livros e mar e canção e nuvem-em-formato-de e debates e quartos de hotéis e amores passados, presentes e futuros e alegria e lua e confusão e filme e pausa pro almoço e desejo -contido-e-vomitado-em-segredo e tudo que cada dia nos proporciona. Essa loucura comedida e curtida em horário comercial, sem gelo e sem açúcar nos leva a crer que não há perigo e não-é-nada-demais, apesar de ser tudo-o-que-é-e-além. Meu amor peça-única e sem direito a devolução, estou me acostumando a respirar você.

Quero dizer teu nome e te confessar segredos que eu nem sei quais são, porque me descubro e me aprendo a cada dia com você. O seu olhar melhora o meu, e tu bota tinta na minha tela cinza e me salva da selva. E hoje o dia foi uma porrada atrás da outra. Verdades duras da vida cotidiana, e teu carinho-em-caracteres me protegeu, me fortaleceu. E não que eu precise de proteção ou de força, é que um carinho às vezes faz bem, e tu é como uma cama elástica que permite que eu me jogue um pouco, que eu tropece um pouco, que eu possa, mesmo que de propósito, me fragilizar um pouco, só pra brincar de fazer você ser necessário, perto-e-distante.

Quero dizer teu nome e confessar perto da tua boca prestes a me devorar que o meu amor livre não é duas, três, quatro ou cinco pessoas, ou tudo ao mesmo tempo agora, ou porralouquice qualquer. Amor livre é quando não há norma que consiga controlar o sentimento entre seres humanos que estão famintos de se amar e se descobrir e se querer bem. Amor livre é quando se rasga o manual de instruções e se entende que a vida vai além de.

Somos todos loucos

Vi, sim. Vi, e me assustei com a verdade bruta
de um mundo cujo maior horror é que ele é tão
vivo que, para admitir que estou tão viva
quanto ele - e minha pior descoberta é que
estou tão viva quanto ele - terei que alçar
minha consciência de vida exterior a um ponto
de crime contra a minha vida pessoal.
Clarice Lispector

A loucura é um tema intrigante, a começar que não há fronteiras para identificar ou compreender, além de não ser claro o que é necessário ser feito, afinal, com a loucura. A compreensão e o que se faz da loucura é, talvez, uma das questões do campo da saúde em que a postura política mais se torna explícita. Os conservadores, sem rodeios, assumem: interna. Prende. É problema. É perigoso. E diz isso a todos aqueles cuja alma não é mais possível sugar, pois de alguma forma está apodrecida ou enfraquecida. É louco porque não produz e está dando trabalho. Maria Rita Kehl cita, certa vez, a fala de um militante do MST, que por sua vez cita uma expressão comum do campo: "Do boi, a gente aproveita tudo, até o berro". E aí ela comenta: "Do homem, o capitalismo aproveita de tudo, até o berro".

A indústria farmacêutica tem grande poder de influência em determinar os diagnósticos. Diz que é baixo ou alto demais, é agitado ou calmo demais, é gordo ou magro demais, é triste ou alegre demais. Os diagnósticos da psiquiatria tem grande influência em determinar o que se diz normal e o que não é. Normal é aquele que não incomoda? Incomoda a quem? Incomoda nossa "ordem"? Que "ordem"? Aquela que atira cotidianamente na juventude na periferia? A "ordem" que adoece e mata nos locais de trabalho mais que nas grandes guerras? A "ordem" que depende de tanta miséria de tantos para tanta riqueza de poucos?

Um diagnóstico de surto psicótico a um perseguido político.
Um diagnóstico de depressão para aquela que sofre assedio moral e sexual.
Um diagnóstico de síndrome do pânico para aquele que recebe ameaças de morte.

Para quem se lança ao desafio de entender a loucura ou qualquer espécie de sofrimento psíquico, sobretudo em uma situação próxima a alguém que passa por alguma espécie de crise, a sensação é de angústia: de quem é a responsabilidade, afinal? Ora, isso é claro. É uma forma de produção da vida que está calcada na produção de doença, e não de saúde. Nossa forma de garantir a nossa existência nos exige que seja extraído nosso tempo de vida e transformá-lo em mercadoria - mais-valia - pra poder ter produto e podermos comprar os produtos. Estamos tão acostumados e sóbrios e domesticados e alienados nessa lógica que não conseguimos pensar o que é produzir os meios de manutenção da vida humana produzindo vida, produzindo saúde. Assim, o que se faz quando o corpo ou a mente diz "basta"? Pra onde vai? Pra onde leva? Não há lugar. Sobretudo quando envolve violência, agressividade, ou qualquer característica incômoda presente nessa sociedade pseudo-asséptica de parede podre pintada de branco pra disfarçar e garantir a "ordem". Mas essa violência e agressividade são respostas a violências e agressividades muito mais intensas, sentidas por todos nós. Como engolimos todas elas, e seguimos nossa vida - sendo até felizes, eu não sei.

Vida que enlouquece. Se perguntam o que há com os loucos, pergunto o que há com aqueles que sustentam alguma sanidade nessa vida maluca, em que tudo é mercadoria. Em que pensar é algo perigoso - e dizer é mais ainda. Em que amar é cronometrado. Em que teu abrigo fica tão longe, e tão impossível, e tão improvável. 

E se somos todos loucos, então que nos prendam todos.
Não sem antes gritarmos, e não há dinheiro que compre o nosso berro.

Tática e Estratégia

Minha tática é olhar-te
aprender como és
querer-te como sois
minha tática é
falar-te e escutar-te
construir com palavras
um poente indestrutível
minha tática é
permanecer em tua recordação
não sei como
nem sei com que pretexto
porém ficar-me em vós
minha tática é
ser franco
e saber que sois franca
e que não nos vendamos
com mentiras
para que entre os dois
não haja cortinas
nem abismos
minha estratégia é
por outro lado
mais profundo e mais
simples
minha estratégia é
que um dia qualquer
nem sei como
nem sei com que pretexto
para que fim me necessites.

Mario Bennedeti

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Outono Fora-de-Temporada

Eu aceito a nossa condição de algo indefinido, incerto, impreciso - contanto que não me perca nisso, e que isso fuja do meu controle. Não está nos meus planos perder o controle novamente. E não é porque eu tenha problemas em me apaixonar sem saber se daquela paixão intensa vai sair um voo ou um tombo - acredite, não tenho problema algum com isso e você sabe, pois você já foi cúmplice, vítima e culpado desse incontrolável querer.

A questão é se jogar sabendo que virá o tombo, sem a mínima possibilidade de, mesmo que por pouco tempo, mesmo que por poucos centímetros, conseguir elevar os pés do chão, que fosse para um voo de galinha. Nós não temos sequer mais asas, meu amor. Elas foram castradas há tempos. Então deixe que a nossa memória de uma bela história permaneça como aquela chama sempre acesa. Não vamos deixar um triste presente vencer um bonito passado. As poeiras, joguemos pra debaixo do tapete, e será nosso segredinho.

Se puder, deixa eu ser aquela-que-você-sempre-amou. Esse lugar é seguro e quentinho, e gosto de recorrer a ele nos dias de frio quando não há ninguém para me servir um chocolate quente gostoso.
Se quiser, conte comigo para tarefas práticas como acompanhar para um cinema ou para um café. Mas não conte comigo para suprir a carência de um carinho ou de um amor gostoso, pois as lágrimas derrubadas por ti já secaram tudo de vivo que tinha em mim.

Agora virei outono fora-de-temporada.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Diálogos interceptados por pensamentos e acontecimentos

eu não quero comer você
eu quero viver você

Mais uma declaração via tela quadrada de um computador, e no momento em que leu sabia que aquilo atormentaria por um tempo. pensou em correr, sorrir, chorar, gritar. Mas o telefone toca e era a vida chamando, então lembrou que tinha que passar no mercado - acabou o arroz - e pensou como a "sociedade-da-forma-que-está-organizada" - expressão que tanto usava pois tinha que esconder a expressão correta "capitalismo-de-merda", - permite um tudoaomesmotempoagora doentio. Patológico, diria os acadêmicos, cheios de pompa. 

Os romances se espremem entre a rotina dos - tictactictactictactictac - prazos. amadurecer então é isso? saber deixar as coisas importantes para depois, para fazer coisas que não achamos tão importante, mas que a vida chama para ser feita naquela hora? Não, não é. Chegou a perguntar, para fazer graça, mas sabia da resposta. Sabia que a saída do amar sem tictactictactictac seria possível quando for possível viver com a vida em nossas mãos, sem delegar a terceiros. e não era da idade e não era do sonho e não era de tio nenhum torturado. Daonde vinha, não sabe, sequer interessa. Interessa que existia, a vontade de mudar e fazer com que as trabalhadoras e os trabalhadores pudessem ser patrões de seu próprio tempo - pra amar, pra cantar, pra fazer poesia, pra todas as formas de produção da vida humana - jeito bem mais bonito de dizer "trabalho".

Respira. A vida segue.

Correto seria se afastar. mas isso implicaria se afastar e era uma verdade insuportável para aqueles dias. Afinal, não havia problema nem crime, diziam um para o outro e ambos para si mesmo: o romance era permitido porque não era romance. A fantasia se alimentava para alegrar as tardes de vazio da vida. Porque algum espaço aquela história preenchia, ainda que levará tempo pra entender qual.

eu não quero comer você
eu quero viver você

Sabia que aquilo perturbaria, porque era papel dela as frases prontas e com jeito de fala de filme, e sempre era surpreendida quando vinha de um outro - coisa rara pois se acostumara com gente sem iniciativa e criatividade que a cercava. Ele definitivamente roubara a cena daquela vez e queria se exibir em cenas de videoclipe das músicas que selecionava a dedo para impressioná-la. ele roubou a cena do encantamento fudido.
.
tu, tu roubaste a cena das tardes sem sal e do coração despreenchido (vazio jamais). eu preciso de alguém-em-quem-pensar, e tu assume então o papel de ator - temporário, precarizado, e mau pago com frases de efeito, além de carinhos a distância restritos a meros caracteres.

sábado, 27 de outubro de 2012

no ponto de ônibus.


- boa noite.
- boa noite. (deixa eu te contar... conheci alguém, não é do tipo que me apaixono, o que só me deixou mais intrigada - o que eu estava querendo com ele, afinal? nos conhecemos em outra cidade e nos reencontramos agora, nessa cidade que não é nossa é é eu não sou daqui e, pensando agora, talvez ele seja que nem eu, meio sem cidade, de vários lugares - isso me lembra marx, "os trabalhadores não tem pátria", mas aí fica pra outra hora esse papo, porque eu queria mesmo era contar o que aconteceu agora... foi o olhar, acredita que clichê ora onde já se viu a essa altura da vida na vida moderna que vivemos alguém se encantar numa troca de olhares? eu não sei por quanto tempo nos olhamos até que trocamos algumas palavras havia outras pessoas na roda mas eu só queria saber quem era ele e daonde vinha e o que fazia de intruso naquela terra que antes chamava de minha; é, pois é, a gente se conheceu aonde até bem pouco tempo eu entendia como a minha cidade... sabe, pra você eu vou contar que eu não sei há quanto tempo eu não ficava com frio na barriga por alguém eu não sei dizer sei que se não tivesse o cigarro eu poderia até estar tremendo com um nervosinho bom quando nos falamos pela primeira vez e as pessoas e a música e a festa em volta e aquele que já amei e amigos que não via há meses e eu só queria virar e falar com pinta de mulher decidida "ei, e quando é que a gente vai prum canto mais sossegado, heim?"  não, não, eu não diria isso eu sei que não onde já se viu estou vermelha só de confessar isso pra você. eu diria "e aí? a gente já se conhece? tenho a impressão de que já te vi..." ai não que coisa mais boba coisa de gente sem criatividade. eu sei que não disse nada disso mas lembro de dizer duas ou três besteirinhas que me fizeram pensar porque eu estava dizendo aquelas coisas e agindo daquela forma e eu não sei era como se fosse outra pessoa ali e sei que a gente foi se encontrar aqui e aí é uma longa história mas eu estava agora com ele e a gente se beijou loucamente, sabe, demorou, antes disso conversamos bastante e foi bacana e no começo ficou um suspense e eu achei que era mais uma dessas coisas que a gente bota uma expectativa danada e depois não consegue viver a altura do que esperava mas não foi e a gente se beijou loucamente como se não houvesse amanhã ou hoje ou ontem ou tempo. desculpa eu nem te conheço mas eu queria contar pra alguém porque foi uma coisa tão maluca e gostosa que me fez sentir tão viva tão bem e pensando bem não foi maluca porque aquilo no fim das contas era vida viva mas ainda assim eu saí, eu saí rápido com pressa, porque ele mora lá longe e não interessa o lá agora mas interessa que o lá é longe e para não alimentar mais fantasias eu deletei o telefone da agenda. eu nem havia chegado no térreo e já tinha sido apagado e eu gosto de guardar essas coisas mensagens coisinhas sabe. mas apaguei todos os rastros dele menos os que eles deixou no meu corpo que não dá pra apagar e não foi por raiva e não foi porque eram mensagens ruins eram bonitas mas pareceu necessário deletar e talvez seja algo que eu só entenda depois mas na verdade não precisaria deixar porque ele ficou na minha cabeça e não sei se sairá tão cedo e...)
- que demora, heim?
- é. nem fala.
- tá esperando o 56?
- sim. você também?
- sim...
- domingo é difícil.
- nem fala... se eles ainda tivessem um horário regular.
- é...

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

vinhetas de adeus

no banco de uma praça qualquer

ela levanta lentamente sua cabeça, que antes olhava pra mão que fazia pequenos rabiscos com um graveto no banco. vira teu rosto como se fosse uma atriz de um filme hollywoodiano e diz: sabe, a vida não é uma brincadeira pra cansar e parar quando bem entender.
ela não concorda com isso. mas queria dizer algo bonito, e falar bonito envolvia fazer metáforas, ainda que não fizessem sentido. essa, na verdade, até fazia, mas ela não sabia se concordava. e sendo sincera, lembrava ter lido isso em algum trecho de algum livro de caio fernando de abreu. ou num desses trechos que todos citam mas ninguém sabe ao certo de quem é. ainda assim pareceu bacana. por mais que custasse a admitir, havia coisas que fazia porque daria cenas bacanas. acostumou-se a viver assim: a vida vivida e o filme imaginário, em que refazia cenas com diferentes personagens.
afinal, parou pra pensar no que disse e percebeu que ela mesmo brincava, e não sabia se existia problemas em brincar. mas percebeu também que brincar cansa. e quando se deu conta disso, percebeu como estava cansada. pensou que queria um pouco de algo "sério", mas pensou melhor e descobriu que não. foi quando viu que não sabia o que queria e não saber era angustiante demais.
a gente se vê por aí. - deu-lhe um beijo na testa e levantou. nunca mais o viu de novo.

no restaurante, brincando com os canudos do suco

.
.
.
silêncio
.
.
.
eram dois estranhos, onde ali já tinha sido cenário de tanto assunto. foi lá que ela aprendeu a ser paciente com a demora dele para escolher o que iria comer, e que ele ouviu, disfarçando o ciúmes, sobre os antigos amores da vida dela. ali decidiram que nas próximas férias fariam algum curso desses que casais frustrados faziam, mas não porque se sentiam frustrados, mas porque poderia ser engraçado. agora, na cena dos canudos do suco, ele até recorda dessa decisão e reflete, então, se desde lá já não existia frustração. então se perde tentando lembrar a primeira vez que ela o olhou sem brilho de novidade. a primeira piada que ela não riu. o gelo derretia, os pés que antes se buscavam por debaixo da mesa, como carícias de dois cúmplices de um crime - sentir tesão num lugar público, comer com os olhos na frente de famílias e homens velhos e frustrados. hoje os pés se repeliam como um pequeno e rápido choque. era o amor pedindo a conta.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

uma semana, cinco dias e.

não procurava ninguém. não era carência de um amor nem de sexo. não era tédio. não era mais uma brincadeira. eu não buscava nada - e dizem que as boas histórias começam quando nada se procura. - mas teus olhos... teus olhos me confessaram tanta coisa que jamais poderia ignorá-los, ou parar de deixar que eles não parassem de se confessar pra mim. e se uma semana depois, você se abriria - em outros cenários - contando histórias, nem perceberia que não era necessário descrever-se ou se explicar. tu já tinha se despido e confessado tanta, tanta coisa.

naquele primeiro dia eu vi um homem e um menino. uma intensa sinceridade. olhos sinceros que eu queria para mim. os olhos e rosto marcados de momentos, histórias, sentimentos. olhos e rosto que denunciavam um homem que só iria se mostrar - a ele e a sua sinceridade - se eu merecesse.
e a verdade é que eu escolhi, antes mesmo de decidir escolher, fazer por merecer. eu escolhi sem nem querer, sem nem ver aonde estava pisando. de repente, eu quis saber. saber o que aqueles olhos poderiam contar, ensinar. o que poderia ser possível viver ao lado dessa pessoa que tanto olhava a tudo, com ares de que a cada olhar aprendia algo novo. olhares que não denunciavam se era tristeza ou alegria - ultrapassavam o clichê dos olhos dos comuns que passam despercebidos na fila do supermercado, nos bancos do metrô, na rua, no trabalho, e que às vezes até nos encantamos ou apaixonamos seja pelo belo rosto, pela bela bunda, ou o horóscopo. olhares que mostravam que o que se buscava estava pra além da tristeza ou da alegria. e eu queria mergulhar nessa tua busca e fazer dela minha - nossa.

de repente eu quis ser essa mulher, para quem tu contaria teus mais sujos e belos segredos.
de repente eu queria aprender, e queria ensinar também.
de repente, eu queria me sentir mais viva com tua vida e queria que me convidasse pra te deixar mais vivo também..
de repente meus olhos te diziam sim, e eu não podia parar de dizer sim, sim, sim.

e se você hoje chama de molecagem, de brincadeira, eu da forma mais declaradamente e deliciosamente covarde deixo pensar assim. pra mim, pra você, pra ela.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Cara ou Coroa?

Decidida, pensou: "basta!"
Embora não tenha verbalizado, seus olhos franziram traduzindo seu pensamento.
"Basta!" - repetiu, ainda mentalmente.
Decidira que iria voltar para casa. Chega, já deu. Hora de juntar os trapos e ir.


Foi então que viu que não tinha para onde ir. Não existia mais "voltar", apenas "ir". Ela e o "casco", a velha mochila manchada com suco de goiaba do mês passado, até hoje sequer um paninho passado. Um maço velho num bolso quase não usado, pra lembrá-la o tempo inteiro do vício antigo que abandonara. Passagens de ônibus e avião espalhados, uns amassados, dobrados, rasgados. Descobrira jeitos diferentes de passar o tempo nos caminhos.

A vida então era um amontoado de lugares com um amontoado de significados. Lugares em que se viveu momentos. Momentos em que trouxeram significados - seriam estes os motivos de retornar aos lugares? Ou fugir, talvez?

A decisão de "ir", levava a uma questão existencial, e na preguiça de preocupar-se com perguntas existenciais, apostou seu futuro na moeda.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

eu não morreria por você

bota água pro café! escuta esse cd. vamos dormir? acorda que tá sol. fila do pão. férias na argentina. dá uma olhada nesse trecho aqui. skol ou brahma? estamos atrasados! o que tá pensando agora?acabou o cigarro. esse teu jeito... vamos na sessão das 21h. você não sabe o que aconteceu hoje!

Eu não morreria por você. Nosso papo não vai por aí. Falar de você, e não falar de vida, erro enorme de se cometer. Eu faria planos pruma vida - ou duas, se assim coubesse.


Você me faz falar, escrever. você me deixa a vontade pra abrir a boca e contar histórias... o que torna as coisas difíceis porque é uma delicia também ficar em silencio ouvindo tuas historias, ou quando desemboca a falar e falar besteiras, que no meio delas se escondem um jeito bonito de dizer que gosta de mim.

De vez em quando eu tiro a casca. Não é fácil sustentá-la o tempo inteiro. É gostoso ficar escondida, mas um desastre não ser encontrada de vez em quando.
Eu te agradeço por ter me encontrado, por mais que eu esteja nessa fase de tamanha insistência em sustentar um esconderijo - sussurro eu, com tom de quem diz covarde: saudade.



Você me bota na vida de novo. Você me deixa grande ou pequena, o que sirva pra fazer eu ir mais além.

Você bota cor na tela cinza.
Eu não morreria por você.
Eu, certamente, viveria mais.
 
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...