Na dificuldade de escrever textos, sigo com trechos, fragmentos do cotidiano.
Do ônibus
Enquanto lia um texto de Sergio Lessa polemizando com Antunes e Iamamoto sobre trabalho e quem é trabalhador, um homem pede a licença para falar no ônibus e discursa, curiosamente entrando no debate. É jovem e fala sobre o desemprego e a contradição atual - de pleno desenvolvimento e tamanha desigualdade. Diz que pode não ter emprego, mas que jamais se esgotarão as formas do homem trabalhar. E assim apresenta seu ramo: vendedor de chicletes. Morango ou menta, sabor garantido por uma hora, segue passando pelos passageiros, que iniciam um debate sobre a dificuldade de conseguir emprego e o humor do bom moço que vende chiclete no ônibus.
- Bom que não está na criminalidade - muitos pensam, alguns falam entre os conhecidos, alguns falam diretamente a ele.
Eu penso: Lessa, Antunes e Iamamoto poderiam pegar mais ônibus.
Da criatividade argumentativa dos reacionários (parte 1):
Uma moça olhava os bottons que eu vendia e por um instante se surpreende ao ver o botton: "Legalizar o aborto":
- Você é a favor do aborto??? - diz a moça, indignada.
- Sou, sim. Você não é? - digo, sabendo evidente que ela não é, mas tentando iniciar um debate.
- Claro que não! Essas mulheres só fazem de engravidar. Mas explique porque você é a favor.
Então explico, brevemente, da hipocrisia do Estado em não garantir a gravidez segura mas exigir que a mulher tenha, no direito de escolha da mulher, na quantidade de mulheres que morrem por aborto e que se legalizasse eram essas mulheres que salvaríamos, mas que as mulheres não deixarão de fazer sexo seguro "porque agora pode abortar", de ser uma questão de saúde pública e assim vai. Ela continua a olhar desconfiada, e então, com tom de esperteza, pergunta:
- Se você estivesse dirigindo e visse um gato na rua, você atropelava?
Eu, indignada, prontamente respondo:
- Não!!!
- Então! - diz a moça, no tom de que tinha provado seu ponto de vista.
Da criatividade argumentativa dos reacionários (parte 2):
(aconteceu com uma companheira)
- Você não é socialista?
- Sou, sim.
- Então por que trabalha no shopping?
- Porque preciso de salário, oras! Me sustente então que eu não trabalho mais.
- Ué, você não é feminista? Se prostitua...
sábado, 11 de maio de 2013
domingo, 5 de maio de 2013
Naquele quarto
As roupas espalhadas no quarto e a luz entrando sem pedir licença, pela janela ainda sem cortina. Havia algo de familiar naquele quarto, mas nunca havia pisado antes lá. Ainda assim insistia: havia algo de familiar, algo de conhecido e reconhecido. Buscava entender, pensando em casas e quartos que outrora pisara, e nisso lembrou de outras histórias, de outras lembranças, a mente ia longe, ainda sonolenta naquele quarto. Forçava a lembrar, a tentar entender porquê tudo parecia tão familiar naquele quarto e forçava a memória enquanto sentia seu corpo sendo envolvido lentamente por aqueles braços. Seus braços.
Talvez não fosse um reconhecimento de território.
Talvez fosse a estranha sensação de cabimento.
Talvez não fosse um reconhecimento de território.
Talvez fosse a estranha sensação de cabimento.
(e por não ser um livro de romance,
uma crônica de amor no jornal de domingo
ou qualquer coisa assim,
a vida não hesitou em encarregar-se
de interromper qualquer possibilidade.
Abduzidos dessa não-história,
mantemos no imaginário,
e investimos em um futuro
pois é a aposta tudo que temos)
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