terça-feira, 25 de outubro de 2011

A continuação.

Parte III - A grande guinada da história dos mundos

A menina seguia fazendo planos.

Entre suas ideias malucas, ouviu boatos de que o rei de seu planeta tinha uma nave, que usava para reuniões interplanetárias vez ou outra. Aquilo era segredo de Planeta, mas um funcionário que ocupava um cargo importante, um dia que estava bravo com o rei deixou vazar. Era ele quem guardava as chaves num cofre do palácio.
A menina, então, encontrou a estratégia central para chegar ao outro planeta: encontrar e conquistar a nave do rei. Bastava agora pensar em táticas para isso ser possível. E todos os dias a menina buscava o cofre e o funcionário do rei.
Certo dia, ficou sabendo também que no local que ficava a nave, havia um monstro verde, grande, com vários braços e pernas, e assustador (porque coisas verdes, grandes, com muitos braços e pernas só poderiam ser assim, assustadoras).
Quem contou isso foi um moço da maior loja de rações do planeta, responsável pelo fornecimento de alimentos do monstro. Contou isso para a menina, em um dia que também estava bravo com o rei.
Com o tempo, o planeta inteiro estava sabendo que a menina estava atrás de alguma coisa que era do rei, e a menina começou a saber que muita gente estava brava com o rei. Assim, os habitantes do planeta dela começaram a ajudar da forma que podiam, fazendo com que pouco a pouco, o planeta todo estivesse mobilizado, de alguma forma, para ajudar a menina.

O menino seguia construindo a ponte.

O menino continuava erguendo, pouco a pouco, a ponte. Recolhia os tijolos, concentrado em seu ritual. As pessoas observavam, silenciosamente, o menino zanzando por ali.
As pessoas de seu planeta viviam em cantos. Moravam em cantos. Eram quietas, cada qual no seu cantinho. Tantos tijolos, e aos poucos foram se habituando a se isolar.
Uma criança que brincava com uma bola observava o menino que cumpria de forma disciplinada a tarefa de recolher tijolos e construir a ponte. A criança era curiosa. Ainda não estava tão domada para caber naquele mundo. Desconhecia das políticas de governo, e ainda não tinha encontrando o seu canto.
Jogou a bola para perto do menino, para se aproximar. O menino pega a bola, sorri gentilmente para a criança - nasce uma flor, cai um tijolo, o menino entrega a bola, pega o tijolo, e volta a construir a ponte.
A criança se aproxima e pergunta, então, o que o menino está fazendo. Não se ouvia muitas vozes por ali, porque as pessoas não se comunicavam. Os tijolos do rei silenciaram as pessoas.
Ele responde, com a voz rouca de quem há tempos não a utilizava, contando da menina. Nascem três flores, caem quatro tijolos - o Governo é ágil. A criança sorri, brotam quatro florzinhas do chão, cai um tijolo. Ela pega e começa a ajudar o menino.
A mãe da criança se espanta. Tantas flores amassadas por tijolos, tanto tempo que encontrou o seu canto para acomodar-se, que havia esquecido o que era estar lado a lado de alguém para atingir um objetivo comum. Ela não sabia da menina do outro planeta. Ela só assistiu a cena - a criança que começa a ajudar o menino que estava há dias, meses, naquela tarefa de construir alguma coisa.
De repente, tomada por uma emoção que parecia adormecida há algumas boas décadas, começou a arrancar os tijolos que constituíam seu cantinho. Possuía uma força que não tinha nome. Aqueles tijolos marcavam inícios de alegria amassados, abafados pelos tijolos do rei, e ela começou a arrancar e juntar num carrinho, até levar, enfim, para o menino.
Ela sorria, e com isso nasciam flores e flores e flores. Flores fortes, com cores brilhantes. E ela chorava, emocionada, e regava as flores com lágrimas, e as flores cresciam e os tijolos desciam e mais flores vinham. Algo se libertou nela, e em tantos outros do planeta que fez com que, algumas horas depois, a cidade estivesse tomada por flores e não já não houvesse mais tijolos pois as pessoas logo o pegavam para construir a ponte.

Parte IV - Esse não é o fim da história, e essa não é uma história de amor.

Ao final do dia, todos os habitantes dos dois planetas estavam mobilizados: em um planeta, as pessoas ajudando a construir a ponte. No outro, as pessoas ajudando a encontrar a nave. Os reis estavam enlouquecendo, sem saber o que fazer.
Ao final do dia, já não se tratava mais de fazer com que o menino e a menina se encontrassem, nem ao menos para o menino e para a menina.
Ao final do dia, o menino e a criança e a mãe e a menina e o funcionário que ocupava um cargo importante e o moço da maior loja de rações e até mesmo - espantem! - o monstro verde estavam mobilizados. Todos buscavam construir no planeta do menino e encontrar no planeta da menina uma forma de viver em liberdade e, que fosse possível, nessa forma de viver a vida em liberdade, de o amor acontecer.

Nem que fosse preciso matar o rei.

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