segunda-feira, 30 de novembro de 2009

E é de ti que não me esquecerei...

“Acreditavam no modo como se amavam, e essa crença era mais forte que qualquer natureza, qualquer sinal que o mundo lhes dirigisse para desmenti-los ou ridicularizá-los. Eram arrogantes e modestos, altivos e extraordinariamente prestativos. Não dividiam seus problemas com ninguém – havia algo de mafioso, um espírito de corpo e uma discrição inflexíveis, ditados pelo amor mas avivados por uma espécie de medo da catástrofe, em sua maneira de evitar as infiltrações –, porém o pequeno apartamento de Belgrano R não demorou a se transformar na clínica sentimental, aberta vinte e quatro horas por dia, pela qual acabaram passando praticamente todos os seus amigos. Todos: os que a cada 1º de janeiro lhes vaticinavam secretamente o fim, os que tentavam desesperadamente copiá-los, os equidistantes, que aprovavam o prodígio, mas volta e meia lhes expunham suas ‘reservas’ – e também seus pais, sedentos da clareza e da sabedoria que seus próprios modos de se amar, ao que parece, não estavam em condições de lhes proporcionar. Nunca julgavam: ouviam. Eram amplos, tolerantes, de uma equanimidade irrepreensível. Talvez essa fosse a única coisa da qual, depois de terminadas as ‘consultas’, em particular, eles aceitassem se gabar: monógamos, conservadores, partidários de uma disciplina amorosa que exigia água e ar e luz diários, não lhes custava nada entender os amigos que militavam na facção oposta – paixões efêmeras, desejo insensato, descontinuidade, inconstância –, mesmo quando a ajuda que lhes prestavam fosse inconcebível na direção contrária."
O Passado, Alan Pauls

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